Exigência

Exigência é a alavanca que move os anseios de mudança e superação, é também a linha de demarcação que aniquila o presente, dividindo e fragmentando o humano; transforma os processos direcionando-os para resultados circunstancializadores do comportamento.

O indivíduo, limitado entre conseguir e não falhar, faz com que tudo seja instrumentalizado. O outro é a variável interveniente, responsável por sucesso e fracasso. A avaliação constante, positivo e negativo, bom e ruim, enfim, os valores são premissas e resguardos configurados como forma de estar no mundo. Exigir, atingir é o que conta. Estes robôs processam e exigem matéria prima. A vida se transforma em regras. As notas escolares validam as relações com os filhos, os acréscimos salariais determinam a felicidade e alegria cotidianas, por exemplo.

Exigir é perder, desde que toda contabilidade busca comparação, supõe erros, supõe acertos transformados em evidências e selos de garantia. Perdendo o presente, balizado e validado pela demarcação, pela busca de um futuro que deverá modificar o erro passado, o indivíduo é esmagado, oprimido pela exigência. O direito substitui o legítimo; a vontade só é exercida através das brechas possibilitadas pelas alavancas - os instrumentos eficientes.

Pedestais de garantia e certeza entronizam culpas, medos, vitórias e fracassos. Processos de desumanização são substituídos por sintomas: pânico, depressão, angustia. Exigir amor, exigir sucesso e superação, exigir acerto é estabelecer armadilhas imobilizadoras.

Exigir é uma maneira de escravizar, é o bom-senso que move a alienação, a submissão ao devido. É através da exigência que se constrói a negação dos processos, substituindo-os por regras, normas e parâmetros.














- "Cultura com aspas" de Manuela Carneiro da Cunha
- "A Folie Baudelaire" de Roberto Calasso


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