Metamorfoses e imitações

"O animal arranca o chicote de seu senhor e chicoteia a si mesmo para se tornar senhor, mas, não sabe que isto é apenas uma fantasia, produzida por um novo nó na correia" - Franz Kafka

A prepotência, resultado da tentativa desesperada de copiar, imitar, cria os improvisadores precários e emergentes. Sem base, sem estrutura de aceitação de seus problemas e vivências, surgem palafitas, suportes e construções para o que se esvai e se perde nos contorcionismos da labuta para sobreviver. Quando se percebe que a fantasia, o adereço é diferente do legítimo, se percebe também que muito já foi conseguido: várias imagens vendidas foram compradas, bons resultados apareceram. Conclui-se que é melhor continuar ganhando, comprando, plagiando, imitando e então, abrindo mão do espontâneo e vivo, aprimora-se a aparência, a representação - mais imagem.

Imitar é fantasiar. Fantasiar é encobrir o que se considera feio seja antecipando o futuro pelas metas e realizações desejadas, seja encobrindo o passado através de disfarces que podem repaginar, apresentar um novo ser, uma holografia das não aceitações, roteiro para dinamização do humano forjado.

Mas, a dinâmica relacional é única e específica, não pode ser reproduzida. É impossível inventar a si mesmo ainda que usando o outro como matéria-prima. A imitação é um processo que cria inesperados, cria armadilhas: o indivíduo, vivendo em função de faz-de-conta, de aparência, perde a dimensão do presente, a dimensão do outro e se transforma em máquina construída a ser mantida. Encontramos esta dinâmica em toda parte, nas famílias, nos escritórios, nas repartições, nas redes sociais, na esfera política etc seres que, se imaginando senhores livres, apenas apertam suas coleiras e cabrestos.

 



- "É preciso duvidar de tudo" de Søren Kierkegaard
- "Reflexão sobre o culto moderno dos deuses fe(i)tiches" de Bruno Latour


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