Ambição e frustração



É muito frequente as pessoas se perceberem inteligentes, capazes e habilidosas. Essas percepções, quando existentes em contextos que impossibilitam ou dificultam sua expressão, criam revolta, frustração e também ambição e ganância. 

Sentindo-se especialmente inteligente e belo, por exemplo, mas não conseguindo ser reconhecido como tal, o indivíduo começa a construir seu caminho de realização criando metas, propósitos e projetos. Aparecem, assim, os que fracassam e os que conseguem. Quanto mais fracassos, quanto menos se aceita a constatação de não conseguir, mais revolta, inveja e agressividade. Essas pessoas formam a fileira dos ressentidos, e muitas vezes até mesmo dos marginais que tudo querem dilapidar. Por outro lado, quando são vitoriosos nas realizações de suas metas e objetivos desenvolvem maior ambição, insatisfação, vazio e desprezo pelo semelhante (que é então visto como inferior, igual a si mesmo) e a super valorização de quem pode lhes abrir portas por estar no alto da pirâmide social econômica.

Fracassados e ambiciosos constituem a massa de manobra, a matéria prima que cria os prepotentes. A impotência não aceita, de ser pobre por exemplo, ou de não ser socialmente reconhecido, ou não ser visto como dentro do ideal de beleza, de não habitar os padrões de excelência aprovados pelo sistema, todas essas constatações geram oportunismos expressos em afirmações como: "sou pobre, mas sou gênio; sou feio, mas tudo decido pois controlo a liderança da empresa". Sentir-se socialmente falhado, não reconhecido, não recompensado é a base dos revoltados e subservientes, pelegos e submissos.

O primeiro passo para atingir resultado é virar produto, é se coisificar, é alienar-se. Esse problema começa quando se resolve avaliar, quando se verifica o posicionamento, as vantagens e desvantagens dentro do sistema e então passa-se a agir em direção a metas estabelecidas: vive-se para atingir índices, situações e sucesso. É a velha questão do ajuste a padrões para conseguir bons resultados, agora mais ampliados pelos contextos neo liberais, como monetização, ou seja, transformação de tudo em dinheiro, em fonte de lucro, em sucesso, em resultado, em bem-estar. É submeter-se à alienação se igualando à medida, a critérios de escambo e assim negando a própria realidade humana, psicológica e vivencial.

A realidade da vida é a não medida, é a vivência do qualitativo, do estar com o outro e consigo mesmo, vivendo seu presente, sua realidade, seus limites, e com eles dialogando e se transformando ao transformá-los. Vida é processo, não é resultado. A continuidade do existir não pode ser emparedada e contida em "caixinhas" de aceitação, decepção, gloria ou frustração.


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