Autômatos

 


 

Quando as pessoas se valorizam pelo que conseguem e realizam, elas são também, consequentemente, desumanizadas, despersonalizadas e esvaziadas de suas possibilidades relacionais, que convergiram para realização de propósitos e planos. Acreditam que viver não basta e que é necessário que se consiga deixar marcas de sucesso e realização, pois é isso que vai trazer felicidade.

 

Os contextos sociais, as sociedades em geral incentivam esses desejos, essa despersonalização, e de geração em geração criam o que é considerado sinônimo de felicidade e realização. No século XX, em sua primeira metade, valorizava-se ser feliz, encontrar o par romântico, formar família. O romantismo era considerado. A II Guerra Mundial corrói essa proposta, substituindo o romantismo pelo “cresça e apareça”, é o self-made man (lembrando que das mulheres não se exigia isso, estavam sombreadas pelo chefe de família). O utilitarismo e eficiência eram louvados. Na segunda metade daquele século a importância ou o apelo era para estabelecer bases e criar patrimônio: a casa própria como a base de segurança material. E ter o equivalente a um milhão de dólares era o sonho, o topo a atingir. Vencer a concorrência era o consagrado.

 

O século XXI começa com um susto: o mundo não acabou! Novas situações, novos apelos e propostas, como criar o próprio caminho, estabelecer a própria rede protetora, maximizar e realizar desejos e sonhos que, no entanto, são reduzidos, pois a matéria prima dos sonhos, a realidade que existe e deve ser transposta, é árida. Não há muito o que extrair. Criar seu próprio mito, virar produto e adquirir todos os likes monetiza a vida. Cada aplauso é um lucro.

 

Nessa imensa possibilidade de riqueza impera a pobreza da mesmice. Tudo é igual. Nada significa a não ser saber quando a plataforma se transforma em horizonte de competição e, então, o grande adversário surge: a inteligência artificial. Ela já sabe o que se quer e como se faz. O nível de automação atinge até os diálogos interpessoais, as interações são mecanizadas. Nesse cenário, é urgente entendermos que a humanização é uma antítese fundamental para que se realizem os referenciais criativos do estar no mundo com o outro.

 

 

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