Alegria, contentamento e depressão

 


 

As mais simples realizações humanas – que decorrem do fato de estar vivo, de estar no mundo – são quase inalcançáveis. Porque essa dificuldade de estar alegre, de estar contente? Metaforicamente: por andar olhando para trás ou pulando para a frente, assim o ser humano vive desequilibrado, desestabilizado.

 

Superar o que acontece, melhorar ou ultrapassar o acontecido, “curar-se do trauma, do fracasso e da decepção” é um pensamento que guia ou norteia a maioria. Olhar para trás, ou evitar o que advém é estar preso, é não ter disponibilidade para viver o que acontece. Tanto bons, quanto maus acontecimentos solicitam ação, presença total. Não se pode vivenciar nem o bem, nem o mal divididos. A fragmentação cria experiência caleidoscópica que altera a vivência e integração do que ocorre. É o que comumente se comenta quando se fala de buscar a plenitude do estar neste mundo. Só há plenitude, consequentemente alegria, contentamento, quando se vivencia o presente, o que está ocorrendo.

 

A alegria antecipada, almejada é quimérica. Se atinge um estado de graça, por exemplo, com antecipação de vitórias e riquezas imaginadas, com o sonhado casamento ou sucesso profissional dos filhos, validadores do exemplo de vida e de sacrifícios diários. Existe êxtase, alegria e contentamento em imaginar, fabular resultados de lucros em investimentos, desde os ganhos em loterias, até as realizações societárias que, em golpes de sorte e esperteza, podem render milhões. Mundo fictício, ilusório. Desse modo, no imaginário, toda essa fantasia é causa de depressão, frustração, empenhos desesperados.

 

Quanto mais se busca alegria, mais se mantém tristeza, desespero. Viver com expectativas ou apegos, viver com situações a superar é sempre solapador, esvazia o indivíduo do único que o constitui: seu presente, suas contradições, suas dinâmicas.  

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