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Vida entre parênteses

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       Frequentemente, por não aceitação de si, do que acontece e do outro, os indivíduos constroem “castelos de ilusões”, cercadinhos protetores e isoladores. Criar o pequeno mundo, o espaço onde se é soberano e onde tudo pode ser decidido, evitado ou aceito é um dos processos de coisificação, de se transformar em objeto, receptáculo dos próprios medos e anseios.   O autorreferenciamento tensiona tanto, que novas familiaridades como se fossem totens resultam dessa pontualização, desse colapso existencial. Deixar de movimentar-se conforme o que acontece, seja como tese ou como antítese do que ocorre – o que seria o ideal – confina e esclerosa possibilidades, isola o indivíduo, pois ele está colapsado. Estar dividido, viver em função de manter compromissos que salvam e alienam, que surgem do medo e da culpa é uma maneira de ser impermeável ao novo, ao que ocorre, à vida. Ideias e programas o situam enquanto a priori, pedras construtoras de isolamento são ...

Autômatos

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    Quando as pessoas se valorizam pelo que conseguem e realizam, elas são também, consequentemente, desumanizadas, despersonalizadas e esvaziadas de suas possibilidades relacionais, que convergiram para realização de propósitos e planos. Acreditam que viver não basta e que é necessário que se consiga deixar marcas de sucesso e realização, pois é isso que vai trazer felicidade.   Os contextos sociais, as sociedades em geral incentivam esses desejos, essa despersonalização, e de geração em geração criam o que é considerado sinônimo de felicidade e realização. No século XX, em sua primeira metade, valorizava-se ser feliz, encontrar o par romântico, formar família. O romantismo era considerado. A II Guerra Mundial corrói essa proposta, substituindo o romantismo pelo “cresça e apareça”, é o self-made man (lembrando que das mulheres não se exigia isso, estavam sombreadas pelo chefe de família). O utilitarismo e eficiência eram louvados. Na segunda me...

Controle

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       Controlar é a maneira pela qual se considera ter todos os pontos fracos resolvidos e os pontos fortes aumentados. Equivale a construir membranas protetoras. Esse tipo de proteção é também uma forma de isolamento. Saber o que é protegido leva à apreensão dos processos de isolamento estruturados pelo indivíduo.   Diante do medo, da omissão, da impotência em conviver com desafios se busca portos seguros onde ancorar desejos e propósitos. Nesse sentido, a judicialização do que ocorre é uma forma de controle dos imprevistos. Essa atitude é precária, pois sociedades mudam as leis periodicamente, os decretos e medidas provisórias são inesperadas ou imprevistas. Nesse sentido, contar com o certo é apostar no errado, é um apoio que falha. Diante do imprevisto, do indefinido se busca também redes de proteção: amigos e familiares. Essas redes frequentemente falham, não são consistentes, pois estão circundadas de ações imprevisíveis, de flutuações. Contar con...

Balão de oxigênio

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      Aceitar ser vital ou fundamental para alguém é se coisificar. É virar o balão de oxigênio. É despersonalização e coisificação. De tanto ser útil, se nega como humano. É frequente essa vivência nas relações familiares principalmente entre mães e filhos e também a encontramos nas relações afetivas nas quais alguém se anula, se conforma, se reduz ao que é útil para ser aceito. Suportar, tolerar é frequentemente uma forma de omissão. Sacrifício e entrega não são atitudes que personalizam. A única atitude que personaliza é a da disponibilidade. É o dado relacional que cria novas configurações e permite que o novo seja o resultado do encontro. Assim, não há cais, não há amarras ou âncoras. Há oceanos de possibilidades responsáveis por novas configurações geradas por esse encontro, e desse modo as relações dinamizam. Quando isso não ocorre surgem posicionamentos, compromissos, apoios, vantagens, desvantagens e coisificação.   📕 ✔ Meus livros mais recentes - ...

Impossível

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    Anseios absurdos nos quais se admite que só o impossível satisfaz é uma característica da atitude onipotente. Lembro da peça de Camus, descrevendo Calígula e seu querer a lua, o impossível que o deixaria feliz.   Não aceitação da realidade, de seus limites e possibilidades é o que, pelo desejo e pelo medo estrutura a onipotência, que nada mais é que um deslocamento da impotência. Chega-se assim a não se admitir os próprios fracassos, dificuldades e medos.   Ao criar o mundo onipotente, se criam pontos que são obstáculos e também pontes solucionadoras. É um artifício complicado, pois envolve inúmeras variáveis. Tudo pode acontecer, desde que tais e tais coisas sejam escolhidas, sejam salvas. Realizar acordos e acertos, vivenciar novos projetos, uma vez que acordos e experiências anteriores sejam mantidas, é uma maneira de explicar os desejos e pactos onipotentes. É um quase ser rei, reinar sem súditos, ou esperar ter súditos mesmo quando não reina. É o i...

Desacordo

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    Muitos indivíduos ao constatar suas impossibilidades, dificuldades e problemas ficam raivosos, se sentem prejudicados. Têm raiva e inveja. Outros, diante de semelhante constatação enfrentam seus problemas, seus impedimentos e mudam, ficam felizes, satisfeitos, sabendo que mudar impedimentos é a solução, sabendo que vencerão o que impede a satisfação e o bem-estar.   A diferença entre essas atitudes pode ser resumida em aceitação ou não aceitação. Quando se aceita uma incapacidade ou um problema, começa o processo de cuidar, de se dedicar ao que atrapalha, ao que impede, enfim, ao problema, conseguindo, assim, nesse diálogo, nesse enfrentamento, nesse relacionamento, o completo domínio do malefício que atrapalha e de aceitação da inutilidade dele.   Quando se deixa de lado o que problematiza e infelicita, e se busca resultados, se inicia um processo de vitimização e parasitismo para conseguir o que não se tem, e a desonestidade, a mentir...

Rótulos

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      Rótulos são fundamentais para classificar, organizar e destacar. São a maneira pela qual se separa, e em certo sentido se identifica. Desde substâncias químicas em um laboratório até mudas de plantas em uma loja, rótulos são indispensáveis.   Rotular é sempre útil quando se quer organizar objetos principalmente. Essa ação útil é transformada em nociva e preconceituosa quando aplicada a pessoas, comportamentos e atitudes, desde que pessoas não são objetos, assim como comportamentos não são substâncias ou produtos catalogáveis.   A dinâmica do estar no mundo submetida a uma infinidade de motivações e contextos não é passível de encaixes, de delimitação e coagulação do ser humano em rótulos. Entretanto é o que frequentemente se faz. As pessoas são rotuladas segundo vários aspectos que se tornam pregnantes em função de atmosferas sociais e econômicas. Alguns dos rótulos mais encontradiços se referem exatamente aos aspectos sócio econômicos, e dentr...