A tábua de salvação é a única saída do sem saída

 



 

A tábua de salvação é a única saída quando não se tem saída. É paradoxal, é um oximoro. A única saída não é uma saída. A situação se neutraliza, mas quando se inventa, sonha ou arbitra uma “tábua de salvação”, acredita-se que o objeto, a tábua, vai mudar o processo.

 

Não há saída, não existem mais recursos, pontos ou esboços. A realidade é a não saída, é o fim. Criar uma tábua, arbitrá-la como salvadora só subsiste nos universos não reais, no mundo da fé, por exemplo, ou no das transformações arbitrárias onde o que não existe passa a existir. Sonhar abre portas exatamente por não existirem portas, tudo é sonho.

 

A trajetória, os caminhos das tábuas de salvação são preenchidos pelas esperanças, colorindo medos e remendando frustrações... e assim as vidas prosseguem.

 

Adiar, procrastinar, esperar são atitudes que fundamentam a criação de expectativas e apostas nas situações salvadoras.

 

“Quem sabe faz a hora, não espera acontecer” já dizia o poeta. Vida é presente, presença, continuidade. Dispensa salvação, pois o que acontece, acontece. Lutar e esperar por absolutos e inesperados redutores de penas, torcer por extinção de males e dores, pela realização de crenças e fantasias que também são apoios, torcer pelo desaparecimento de mágoas e problemas, é construir catapultas para o abismo do vazio, do desaparecido, da negação do vivenciado.

 

Enquanto existir continuidade, seja do que foi ou do que está, existe presença, realidade, vida. Quando isso desaparece vem a descontinuidade. Outras dimensões invadem o dia a dia: morte, depressão, delírio, medo e ansiedade.

 

Comentários

  1. Vera, assistiu o filme coreano Vidas Passadas? Como sempre, seus artigos mexem comigo, e neste último, me ocorreu mencionar esse filme (ainda não sei bem por quê, mas acho que tem a ver). bjs

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    1. Assisti sim, Ana, efeito Zeigarnik, isto é, como as interrupções geram motivação e criam permanência do interrompido.

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