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Esperteza

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  A capacidade de esconder incapacidades é esperteza ou oportunismo, é usar o outro, é roubar ideias ou oportunidades como maneira de sobressair. Todo objetivo de vitória e conquista cria uma fileira de oportunistas. É o empregado que quer virar chefe, é também a garota que quer conquistar seu patrão, quer ser a melhor, a atriz mais considerada, a melhor empreendedora, a melhor do grupo. Essas pessoas lutam para conseguir realizar desejos, para melhorar currículo a fim de mais consideração e maiores recompensas econômicas. Não há confiança, não há disponibilidade, não há espontaneidade. Há luta constante, desconfiança, armações e mentiras para conseguir o que se quer. É o uso contínuo, diário, que tudo invade. Ser amigo dos poderosos, estar no caminho do que leva ao dinheiro, fama e poder, é o que se quer e é o que se faz. Habilidade para manter perfil e comportamento público torna-se um objetivo constante. A vida, a comunicação com os outros são mantidas nesses parâmetros. Vale o que

Circularidade

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  Nada aponta para nada, a monotonia, a repetição, a opressão são constantes. Falta saída, não existem perspectivas. A quem se reclama? A quem se pede ajuda? Quem salva? Quem perdoa? Fechados em si mesmos, os sistemas giram, apertam e dissolvem. Falta perspectiva, o amanhã é hoje, igual ao ontem. Tempo continuado pela opressão das engrenagens. É o poder do opressor, é o poder do oprimido. Tudo é massa que ocupa e cria obstruções que são as escadas para mais dissolução. Quebrar círculos viciosos, sair da submissão, da expectativa de solução, só é possível quando o indivíduo se detém. É a parede, a pedra no caminho, a pedra no sapato que tudo muda. Quando não mais aceita ser oprimido e submetido pelos desejos alheios, quando se recusa a participar do que aliena, quando diz não ao que alimenta e explora, se quebra círculos viciosos. Não havendo circularidade, não há manutenção de padrões, e o inédito surge. Esse novo é aglutinador, possibilita nova configuração, novos desenhos atenuadores

Finalidade

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Existir por existir é considerado um despropósito. O pensamento corrente, principalmente nas áreas psicopedagógicas, é o de que sem propósitos, sem objetivos, nada significa, nada se constrói. Acontece que não há finalidade no existir, pois existir só existe enquanto existência. Buscar finalidade é uma maneira de negar ou absolutizar continuidades, processos. A necessidade de ter controle e poder cria parâmetros destruidores de continuidade. Isso pontualiza, fragmenta, desestrutura contextos estruturadores de apego e de afetos. Fazer tudo convergir para situações julgadas ideais, boas e necessárias, por exemplo, é estabelecer objetivos que pretendem validar e justificar o existir. O fundamento dessa ação é o de que existir não basta. Esse não bastar por si mesmo aniquila espontaneidade e uniformiza vivências. É a vida para depois ou a vida a partir de. São referenciais que enjaulam possibilidades, que despersonalizam em função de necessidades satisfeitas, tarefas cumpridas. Por consegu

A igualdade do diferente, a diferença do igual

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A igualdade do diferente, a diferença do igual resulta de comparação. Comparar é identificar, tanto quanto é diferençar. É um processo dinâmico que aponta para várias direções. No âmbito humano, indivisível, comparar pessoas é arbitrário, desnecessário e abusivo. Entretanto é a catástrofe diária que assola a humanidade. Cidadãos de bem, cidadãos do mal. Etnias melhores, etnias piores. Quando se compara se destrói a humanidade, o homem comparado. Medidas são sempre redutoras e mecanicistas, embora permitam funcionalidades e sistematizações. Pessoas não são objetos, mas cada vez mais elas são assim consideradas e tratadas, inclusive por elas próprias. Quando um ser humano se sente desprezível e pensa que precisa ser rico para ser considerado, ele, nesse momento, se transforma em objeto, produto que vai ser "melhorado" para maior valor de troca, de venda. Negar os próprios limites, não aceitá-los é delirante. Essa ação fora de tempo, fora de lugar - distópica - é aniquiladora da

Embates

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O todo não é a soma de suas partes. Tudo é contínuo, entretanto, nem sempre essa continuidade, essa totalidade é percebida, pois se tornam enfáticos alguns aspectos que a configuram. É exatamente essa parcialização que cria partes, grupos e partidários. Na França, logo após a Revolução Francesa, nas assembleias de decisões parlamentares se organizou os dois principais grupos sociais oponentes à esquerda e à direita do orador principal, e foi assim que esses termos "esquerda" e "direita" entraram no debate político. Com o passar do tempo, extrapolando esse contexto específico e ganhando adjetivos (como bom/ruim, legal/ilegal), os dois termos permanecem até os dias atuais, quebrando uma totalidade e criando outras. As dinâmicas são infinitas, sempre o todo cria outro todo. É o clássico exemplo do mercúrio, metal líquido cuja gota ao cair cria infinitas outras, iguais entre si e diferentes pelo espaço que ocupam, a alteridade é dada pela divisão. Os iguais brigam, se c

Natural e artificial - imanência e aderência

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  Outro dia, lendo o romance "A Trindade Bantu" de Max Lobe, encontrei: "quem come não é o que tem fome, quem come é o que tem comida". Imanência e aderência, necessidade e possibilidade vieram à minha cabeça. O ato natural de beber água quando se está com sede, comer quando se tem fome é alterado pelas injunções econômicas e sociais do sistema. O básico, o necessário à vida passa a ser contingente, embora não supérfluo. É preciso dinheiro para ter comida, não basta ter fome. É como se para andar não fossem suficientes as pernas, pois os caminhos foram explodidos, destruídos. Todo o natural ou originário está submetido. Esse processo se agrava quando pensamos no transcendente, no relacionamento com o próximo enquanto percepção do outro, o semelhante. O outro é geralmente pensado como objeto útil ou inútil. É o necessário ou o depreciado, e ainda pode de necessário se transformar em obsoleto a depender de circunstâncias (é assim que mães e pais idosos ou dependentes

 Contabilização de infelicidades

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Não ter alcançado os objetivos determinados pelos desejos cria frustrações. Como se lida com essas frustrações irá configurar a vítima, o invejoso e principalmente o oprimido. Não conseguir vitórias e destaques sociais impõe, quando não se aceita esses resultados, constante verificação de resultado. Diariamente se avalia e verifica os degraus que podem possibilitar sucesso. Conhecer pessoas influentes, ficar do "lado bom da corrente" torna-se atitude cotidiana e é entendido como buscar oportunidades e caminhos para o sucesso. Ter o que os outros conseguem é a meta, a medida que tudo avalia. Não se discute mérito, capacidade, apenas se inveja, se percebe situações como o que não se tem. Desde os amores não realizados, até a proeminência empresarial, o que se revela e avalia não corresponde às ambições e segue a luta pelo direito de conseguir. Sente-se merecedor pelo simples fato de não ter. Tudo é visto como o que deve e precisa ser alcançado. Nessa loucura desvairada de compo

Colisões

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  Sempre que se sai da rota traçada sem prestar atenção, sem questionar impedimentos e obstáculos surge colisão. Esbarrar, colidir pode ser sinônimo de ser desatento, de destruir, tanto quanto de libertar e transformar. O pé que pisa, a mão que submete, o grito que organiza são invisíveis aglutinadores de despersonalização. Viver apenas para ter conforto e tranquilidade pode ser uma perigosa escolha, pois enfraquece, transforma o indivíduo em um ser abrigado, suportado, cuidado, realizado. Esse apassivamento é sempre custoso. Abrir mão da criatividade, da espontaneidade e liberdade é o que geralmente configura o bem estar. Por mais ampla que seja a prisão, por mais confortável e infinita que seja sua extensão, é sempre resultado de compromisso, acertos ou fixação em vitórias almejadas e conseguidas. É uma antecipação do fim. Tudo que era necessário foi conseguido. Resta usufruir e cuidar. Filhos, leis e sociedades aí estão para validar essa vitória. A vida continua mas o prazer de ter

Riscos

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Após experiências de abandono, tristeza e isolamento, o indivíduo pode concluir que nada há de mais seguro que a imobilização. Essa conclusão traz tranquilidade, mas também desespero. Ele começa a ter medo de perder a paz encontrada na imobilidade solitária, e assim se desespera. Acontecer alguma coisa que ele não consegue controlar, cujo domínio o exila, é aterrador. No tratamento psicoterápico, a recuperação dessa configuração é difícil e lenta. Fazer a pessoa descobrir que existe um outro além dela própria, e que não a ameaça nem cobra, mas assiste, é o início da restauração, é a descoberta de estar no mundo e a recuperação do perdido. É uma vivência de tateios, de insegurança, de expectativas, mas é uma vivência de algo além de si mesmo, e isso é dinamizador. É se arriscar a viver, é sair da casca, é se levantar do chão. Socialmente, o equivalente dessa situação psicológica é encontrado no modo como as mulheres (metade do planeta) são tratadas. Pequenas leis, novas políticas trazem

No mundo distópico a luta pela utopia no Brasil - Novos Velhos Ventos

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Posse da Ministra dos Povos Indígenas Sonia Guajajara em Janeiro de 2023, em Brasília-DF - Foto: Valter Campanato/Agência Brasil CC0   Em uma sociedade, quando a vida transcorre em meio a situações de grande opressão e estados de privação ou desespero, uma realidade assim é chamada distópica; ela é, em filosofia, a antiutopia. A utopia, geralmente irrealizável, é o sonho, é a sociedade organizada de maneira perfeita, com felicidade, justiça e bem-estar. Recentemente aqui no Brasil, assistindo à posse, como Ministra, de Sônia Guajajara - do grupo indígena Tenetehára , do Maranhão - no recém criado Ministério dos Povos Indígenas, fomos privilegiadamente brindados por uma conversão rara de conceitos. A utopia, o sonho, a volta dos direitos dos indígenas, povos originários de nosso país, em verdade não é um sonho, é antítese necessária à salvação do planeta. Davi Kopenawa, líder do povo Yanomami, fala: "os índios estão segurando o Céu, enquanto lá fora o povo da mer