Postagens

Mostrando postagens de abril, 2017

Persistência e padrão

Seres humanos não são máquinas, mas na maior parte do seu dia vivem como se fossem. É uma realidade massacrante suportar esta desvitalização, este massacre do humano. É preciso considerar alguns aspectos que minimizam, que desconfiguram esta mecanização. Estando no mundo, somos organismos, realizamos funções e estamos conectados a inúmeros sistemas que nos caracterizam ao nos descaracterizar como individualidades. Do oxigênio aos pés no chão, a lei da gravidade, estamos realizando nossa trajetória humana. Sem esta repetição, sem esta frequência, sem estes mecanismos respiratórios, deambulatórios, estaríamos inertes, imobilizados. Em certo sentido é mecânico sobreviver, subsistir, manter a nossa humanidade. Precisamos realizar as funções mecânicas, automáticas, medulares para realizar o cortical, o relacional, o perceber o outro. A persistência deste processo libera individualidade ou a sobrecarrega. Tudo vai depender de como nos relacionamos com os padrões (ambientais, cerebrais, o

Encaixes

Para certas pessoas, para certos indivíduos, a única coisa a ser feita é encaixar-se, adaptar-se, adequar-se ao que vier. A redução à sobrevivência, às necessidades básicas, é a atitude que caracteriza estas pessoas. Como se consegue esta redução das dimensões psicológicas, das dimensões relacionais, aos aspectos puramente orgânicos da sobrevivência? Ter passado fome, ter passado dificuldades, ser uma pessoa desconsiderada, tratada frequentemente como escória, nada significando, faz buscar um alento, o alimento, o afago - mesmo que humilhante - é a única saída vislumbrada. Vidas adequadas são vidas encaixadas. Este transformar-se em peça da engrenagem, validade compromissada e apta para alívio, “felicidade líquida” (como conceitua Zygmunt Bauman ), identifica consumidores e consumidos. Neste contexto, viver é adequar-se ao que parece dar bom resultado e evitar o que pode causar distúrbio ou massacrar sonhos. Mulheres que apanham (para que a família continue mantida); seres que se pr

Fácil e difícil

Fácil e difícil são critérios extrínsecos ao que acontece. Nada é fácil, nada é difícil enquanto situação que acontece. Só existe critério de facilidade ou de dificuldade quando mediações avaliadoras são exercidas. Medir, configurar, avaliar situações enquanto facilidade ou dificuldade varia de indivíduo para indivíduo, de época para época. Exemplo bem contemporâneo: nada mais fácil do que fazer refeições fora de casa, menos de cem anos atrás esta era uma situação cheia de dificuldades. Se considerarmos as necessidades fisiológicas, que por definição são sempre fáceis ou difíceis à depender da higidez orgânica, podemos começar a perceber a facilidade/dificuldade desta questão, enfim, começamos a perceber que o problema não se esgota em si mesmo, exige sempre interfaces configuradoras. Viver, sobreviver, ser feliz, ser disponível é o que há de mais fácil, tanto quanto de mais difícil. Educar-se, educar filhos, viver em sociedade, participar de grupos, conhecer assuntos e explicá-los

Deveres

Todo sistema, do social ao familiar, estrutura, impõe e possibilita regras, deveres, direitos. É um processo resultante da própria estrutura dos sistemas, entretanto, transgressões, alternativas podem modificar e minar esta configuração relacional. Quando se insere ordem, demandas e configurações alheias à estrutura, surge um sistema de convergência, obturador do existente, ou no mínimo dispersor das ordens estruturadas. Famílias se organizam para a paz, tranquilidade de vivências entre seus membros, mas quando é colocada a ideia de que paz e tranquilidade só se consegue sendo igual às famílias que têm muito dinheiro, muito poder, esta colocação cria uma mudança: não mais se vê paz e tranquilidade pelo que se vivencia, mas sim pelo que se consegue: dinheiro, poder. Este novo referencial gera novos valores, novos deveres, alheios às estruturas daquele sistema anteriormente estabelecido. Ser o melhor, o mais rico, o mais poderoso, é o novo objetivo e assim as configurações anteriores