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Mostrando postagens de julho, 2011

Autorreferenciamento

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" Duas tarefas no início da vida: limitar seu círculo cada vez mais e verificar continuamente se você não está escondido em algum lugar fora do seu círculo " - esta frase de Kafka é uma maneira de resumir o autorreferenciamento. Vivenciando o que ocorre no presente, no aqui e agora, estamos disponíveis para o outro, sem regras, sem medos. É a dinâmica relacional que permite teses abertas a antíteses, desencadeadoras de sínteses. Por causa disso os seres humanos motivam-se, apreendem, desenvolvem-se, relacionam-se. Quando este processo relacional fica posicionado nos próprios padrões, estrutura-se o autorreferenciamento Podemos dizer que o eu, ego é o autorreferenciamento, é o posicionamento. Quando reduzido a suas posições, sua história de vida, seus sucessos e fracassos,  suas metas, o indivíduo se autorreferencia. Passa a ser o centro à partir do qual tudo é percebido, pensado, lembrado. Ser centro é estar posicionado. O contexto, o fundo não é percebido,

O Inconsciente

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É o que não é consciente. Para Freud é a base da vida humana, é a esfera incognoscível de onde emergem os desejos, motivações, medos, criatividade, enfim, um campo misterioso e inacessível que não só compõe a psique humana, mas a fundamenta. Nas explicações  deterministas, biológicas e causalistas o homem é o somatório de dinâmicas existentes no seu psiquismo. Para os psicanalistas, através da projeção inconsciente expressamos nossos medos (fobias), resistências,  preferências e desejos, que são então 'percebidos' pela consciência. Percepção é entendida aqui de forma elementarista, ou seja, como elaboração de dados apreendidos pelos sentidos; da mesma maneira, a consciência elabora os dados advindos do inconsciente. O inconsciente é uma instância psíquica e como tal tem existência espacializada, tanto quanto é um constructo responsável pela explicação do comportamento instintivo sexual e afetivo social. É um conceito necessário à explicação psicanalítica sobre o psíqu

O denso e o sutil

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Tudo o que conhecemos, toda nossa vida psicológica decorre do que percebemos. Somos um organismo com um sistema nervoso responsável pela realização deste processo perceptivo. O que nos permite perceber e o que é percebido vai depender das relações perceptivas que estabelecemos com o outro, com o mundo, com nós próprios. O processo perceptivo, relacional sempre ocorre no tempo presente. Seja esta percepção de algo presente, passado ou futuro, quando ela é vivenciada, ela é o que ocorre, não importando se é uma lembrança, uma antecipação ou um estar diante. O contexto de estruturação da percepção pode estar relacionado com o que ocorreu (passado) ou com o que vai ocorrer (futuro), mas o que se vivencia é sempre presente, quer seja o que se lembra, quer seja o que se antecipa. Vida psicológica é vida perceptiva, podemos dizer que o processo perceptivo nos constitui, nos define e identifica. O pensamento é a continuidade, o desdobramento de nossas percepções; a memóri

Raiva

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Sempre me espantei com a raiva. Esta forma de deslocamento da impotência, da frustração, da omissão é destruidora, congestionante, pontualizante. Quanto mais se extravasa a raiva, mais se aumenta o autorreferenciamento. O outro destruido, agredido, significa vitória alcançada. A raiva é o vetor transmissor de desejo. Quando se consegue satisfazer a raiva, se consegue realizar o desejo de destruir. A raiva, este contorcionismo - transformação de necessidades em possibilidades * - é frequentemente gerado em situações de falta, de carência, de nunca ser considerado, de estar sempre pisado, ofendido, humilhado e oprimido. Ao trucidar, ao matar ou destruir, seja um carro, um animal, um ser humano ou a festa comemorativa de promoção do colega de trabalho, por exemplo, o raivoso se sente vitorioso. Não existem pequenas ou grandes raivas, raiva não é quantificável; o seu efeito é que vai depender do seu contexto estruturante, responsável desde envenenamento de cachorros a planos

Por que algumas mulheres que são espancadas pelos companheiros, continuam com eles?

As sínteses, os resultados são gerados pelas contradições inerentes ao processo - é a dialética da relação senhor-escravo, citada por Hegel, retomada por Marx quando falava que o processo de exploração exercido pelo patrão (o explorador) sobre o empregado (o explorado) é aplacado pela satisfação de necessidades propiciadas pelo explorador. Em meu livro Mudança e Psicoterapia Gestaltista eu resumo esta dialética dos processos ao dizer que "o que apoia oprime". O companheiro que espanca a mulher é o mesmo que apoia, que sustenta, que dá status, que dá jóias ou comida. Por que mulheres são oprimidas? Por que não se vê homens espancados por mulheres? Existem diversas respostas, desde a explicação que considera a fraqueza física da mulher em relação ao homem; a histórica questão socio-econômica que sempre permitiu ao homem a condição de provedor; a passividade, a sensibilidade feminina; afirmações do tipo "os homens são de Marte (agressivos) as mulheres são de Vênus

Querer não é poder

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A instrumentalização do que há de mais legítimo, autêntico e imanente no humano, gera seres contingentes, nos quais a vontade, a motivação, o querer passam a ser vistos e utilizados como alavanca para se alcançar uma meta. O que era próprio, característico é então modificado, processado e destruído, principalmente de duas maneiras: a primeira, quebrando a gestalt, a totalidade ser no mundo, através de divisões criadoras do interno e externo; e a segunda, criando a falta, que surge pelo pedaço arrancado para a instrumentalização, falta essa responsável pelo desejo, vetor de mercado ultra necessário ao homem que se realiza através do consumo. O que era natural, resultante de um diálogo, resultante da vivência do presente, vivência essa geradora de perspectivas (neste caso, futuro é o que continua o presente) passa a ser artificialismo construido, ponte para realização de metas, ambições que nos impulsionam e alavancam (neste caso, futuro é situação ou coisas a serem atingidas, nega

Liberdade e escolha

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Quando nos colocamos a questão da liberdade é inevitável lembrar que Sartre dizia que o homem está condenado à liberdade; lembramos também que Freud ao invés de falar em liberdade, preferia falar no processo da repressão exercida pelo superego no controle dos recalques inconscientes; e quanto às doutrinas religiosas, estas consideravam o livre-arbítrio como sinônimo de liberdade. Nos anos 60, estávamos em plena Guerra Fria, a palavra de ordem era participar, era comprometer-se com uma causa. Os "pequenos burqueses" eram os ditos alienados, deveriam se engajar para mudar a ordem capitalista vigente. Sartre misturou Heidegger e Marx - alienação com Dasein - o em si com o para si, criando novos dualismos. A necessidade da inclusão política contra o sistema valorizava a escolha. Em 1988, por ocasião do lançamento do livro Relacionamento Trajetória do Humano, em entrevista à jornalista Rosane Santana do Jornal A Tarde, eu dizia: A TARDE - Neste quarto livro, voc

A dúvida continuada dilacera

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A afirmação negada que possibilita uma pergunta é a dúvida. Este aspecto dinâmico gerado por antíteses estrutura a dúvida, desenvolvendo motivação, curiosidade. Isto nos leva a crescer e a mudar. A dúvida pode gerar desenvolvimento humano tanto quanto científico, social e filosófico. Descartes, por exemplo, ao vivenciar a dúvida decorrente de inúmeras perguntas colocadas e negadas, chega ao ponto de duvidar da própria existência, supõe-se sonhando ou existindo sob a ação de um gênio maligno. Em suas próprias palavras: " considerar-me-ei a mim mesmo absolutamente desprovido de mãos, de olhos, de carne, de sangue, desprovido de quaisquer sentidos, mas dotado de falsa crença de ter todas essas coisas ". Ele é o fundador do racionalismo e portanto enfatizava a dúvida como imprescindível na busca de conhecimento. Na continuidade de suas reflexões, ele consegue resolver a dúvida sobre a própria existência, constatando-a através do pensamento; é o famoso cogito cartesiano

Ansiedade

O processo da não aceitação - a neurose - cria posicionamentos e imobilização. As frustrações, as impotências, o medo, o pânico de estar no mundo com o outro, são também sintomas desse processo. Viver sem conseguir realizar desejos deixa o ser humano angustiado. E ao estabelecer planos e metas para mudar o que o estigmatiza, ele aumenta sua não aceitação, iniciando assim o processo de ansiedade. Cada meta atingida, cada desejo realizado, esvazia. O desejo saciado não satisfaz, pois ele, o desejo, surgiu de uma fuga, de um deslocamento, de uma vivência não presentificada, falta base, falta chão, falta estrutura. É o vazio sob a forma de despersonalização, submissão, sobrevivência, massificação. Tudo isso aparece de várias maneiras no comportamento de quem está vivenciando esse processo e pode surgir como vício, como apego,  compulsão ou  ganância, por exemplo. É o popularmente expresso como: " quanto mais se tem, mais se quer ". A realização das metas gera a necessid

Realidade Virtual

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Na história da computação o conceito de realidade virtual começou a ser usado na década de 70, no início alternando entre realidade artificial e realidade virtual, para designar um tipo específico de intercâmbio homem-computador no qual era criado um ambiente que permitia a interação de vários participantes. Com o desenvolvimento da internet e sua democratização o conceito caiu no senso-comum, alcançando enorme abrangência; estar online é estar no mundo virtual. Seja entre técnicos da computação, seja entre usuários comuns, o fundamento do conceito de realidade virtual é a idéia de simulação: a "realidade verdadeira" é simulada pelos computadores, seus sistemas e seus usuários. Várias questões e debates surgiram sobre as consequências da vivência desta "nova realidade", como se um novo mundo estivesse surgindo e com ele um novo homem. Foi, inclusive, cunhado o termo geração virtual para os que nasceram a partir de 1980 e todos os que nasceram antes desta data sã

Círculo vicioso abismal

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A reviravolta, ontem, no caso Dominique Strauss-Kahn, me lembrou a história contada por Albert Camus em seu livro " O Estrangeiro ". Na história, Marsault é condenado, principalmente por sua história de vida e pelo seu comportamento durante o enterro de sua mãe: não chorava e se mostrava indiferente. Estas atitudes, para os jurados, indicavam frieza e falta de envolvimento filial, ele era insensível, frio… já estava condenado! No caso Dominique Strauss-Kahn descobriu-se que a camareira que o acusava de estupro mentiu no preenchimento do formulário de imigração para os EUA e que, além disso, era amiga de um traficante e recebia depósitos bancários do mesmo. Concluiu-se que era mentirosa, que era envolvida com criminosos e poderia estar praticando extorsão. Dominique Strauss-Kahn teve suspensa a sua prisão domicialiar, apesar do processo continuar em função das dúvidas envolvidas. O perfil da camareira foi o indutor da suspensão da prisão domiciliar. Normalmen