Postagens

Mostrando postagens de 2022

Aflição e incerteza

Imagem
    A busca de resposta, o clássico ser ou não ser de Hamlet, uma eterna questão humana, agora é transformada em expectativa de resultado. O binário, o clicado, o determinado prevalecem. Essa redução da realidade e dos propósitos e vivências às contingências, transforma o ser humano em objeto. Objeto de expectativa, adorador de resultados atingidos, desde a vitória de seu time às notas obtidas em sua tese de doutorado. Entre o agora e o depois há o abismo da espera e da dúvida. A curiosidade, a torcida, o desespero, a aposta são a chave mágica que, acionada, possibilita calma após as agruras do esperar. Apostar e torcer preenchem o abismo da expectativa. Incluir o sagrado, fazer promessas às divindades é construir pontes para encurtar o desejo de agarrar o esperado. A expectativa está mais próxima do desistir que do acreditar. Quando se tem certeza, expectativas não são estruturadas. As certezas são monolíticas, não têm vazio, vácuo a ser preenchido. Por exemplo, de uma maneira geral n

Confluências

Imagem
  Todo rio desagua, converge para o mar. Mesmo essa evidência, essa verdade se torna discutível quando outras variáveis interferem no processo. Rios podem ser desviados de seus cursos para criar usinas hidrelétricas ou para privilegiar pequenos ou grandes feudos. O natural, o intrínseco pode ser descentralizado, operado em função de circunstâncias e objetivos outros, extrínsecos às imanências processuais. Atualmente, no contexto de população e consumo, constatamos inúmeras confluências arbitrárias. Todo indivíduo famoso, desde o que recebe o 1k de curtidas até os "heróis futebolísticos" passam a ser considerados sabedores de tudo. São pessoas bem vistas, cheias de seguidores, curtidas e comentários, consequentemente formadoras de opinião, e assim devem entender do que é bom e melhor para todos e tudo. O super craque de futebol indica a melhor chuteira, mas como é super bem visto, pois ele é um craque de futebol, passa a ser também porta-voz, arauto de tudo que se quer promove

Diluir

Imagem
  Quando se dissipa o que concentra - como os objetivos e propósitos - se pode perceber as motivações sob forma de polarizantes ou determinantes do que motiva. Toda concentração de motivação implica necessariamente em ela estar voltada para o que ainda não aconteceu, em estar voltada para o que se precisa, o que se quer que aconteça.  Ressaltar a temporalidade, a defasagem entre o que está acontecendo e o que se deseja que aconteça impõe percepção do que está presente. Tudo que acontece, enquanto acontecimento, é presente, consequentemente não sofre acréscimo.  É o desejar, o precisar que aconteça, que cria ansiedade. Geralmente a ansiedade é instrumentalizada. Inúmeras vezes ela funciona como escada para atingir o que não está presente, e também para preencher o vazio, o gap da expectativa. É um preenchimento arbitrário, consequentemente polarizante, atrator de tudo que se constitui em obstáculo, resíduo alheio ao que está acontecendo. Diluir expectativas e desejos é uma maneira de d

Repulsa e restrição

Imagem
  Detestar alguém ou algo é reduzir inúmeras variáveis ao próprio padrão, algoritmo de percepção do mundo. Essa redução aos próprios interesses e preferências, traduzida por raiva, medo ou inveja, transtorna e esfacela o real. É o a priori , a vivência antecipada.  A aversão cria padrões, determina preferências e antipatias, sonega possibilidades. É frequente a incidência dessa conduta nos casos de preconceito racial, de gênero e outras tantas atitudes decorrentes de segregação. Esse tipo de postura é responsável pela miséria, pois com ela se corta metade das cabeças da humanidade (restrição às mulheres) e se segrega cérebros, vitalidade e a capacidade de ao menos dois terços dos habitantes do planeta. É dessa matéria prima da aversão, da repulsa, que são criados xenofobia, racismo e inúmeros outros preconceitos. Aversão, restrição, preconceitos decorrentes de misérias e situações antecipadamente vivenciadas criam tabus que entravam e apequenam a trajetória humana. Viver é descobrir, p

Satisfação e apego

Imagem
  Toda vez que necessidades ou vontades são satisfeitas causam prazer e assim criam-se apegos, diziam os antigos yogues. Nas suas afirmações eles geram valores e dizem que quando esse apego se refere ao amor dos amigos, do cônjuge ou dos filhos, ele não é prejudicial, é afeição, é compaixão e se refere mais a situações mentais que físicas dos indivíduos com eles próprios, diferente do apego ao que sacia as necessidades individuais. Esse dualismo valorativo entre físico e mental, entre necessidade biológica e "preferências mentais" individuais pode ser abolido caso pensemos na necessidade como denominador comum de ambos apegos: a necessidade do que causa prazer (água, sexo, alimento) ou a necessidade do outro (apoio, carinho, participação). Qualquer situação configurada e traduzida como necessária é alienante, desde que só a partir da mesma, da satisfação da necessidade, é que se vai configurar o bem-estar, o equilíbrio, a homeostase, o prazer. Quando o que nos cerca é percebi

Conhecimento é percepção

Imagem
  Toda percepção é conhecimento, ou seja, perceber é conhecer pelos sentidos: visão, audição, olfação, gustação e tato. Perceber é apreender o mundo, a realidade, o que está diante. Quando se percebe que percebe, se constata, se insere as constatações em referenciais. Esse banco de dados é individual e é o contexto para aplicação e restauração, ou seja, para tradução do conhecido. Quanto maior o referencial cognitivo, maior a possibilidade de constatação. É saber que sabe, é conhecimento e reconhecimento das redes individualizantes. Família, professores e sistemas que encaixotam, que agrupam fatos e realidades segundo conveniências e regras pessoais e sociais, direcionam e dificultam a ampliação do conhecimento, desde que o canalizam para propósitos específicos. Ser livre é validado pelo acesso a informações sem censuras, nem seletividades decorrentes de interesses particulares. Separar o joio do trigo requer formação e informação. Ser formado e informado por heterogeneidades perceptiv

A cegueira da ambição

Imagem
    Querer obstinadamente, ou precisar de alguma coisa ou de alguém, faz com que as pessoas caminhem às cegas para realização de desejos. O desejo, o propósito, o que se quer, funciona como uma espécie de farol, de luz que ilumina as trevas. Assim, só se avança às cegas, só se trilha os escuros caminhos quando se está obcecado, seduzido pelo êxito, pelo resultado do que se quer conseguir. A pessoa apenas se coloca a possibilidade de vencer ou vencer. Não há perspectiva, não admite a possibilidade de derrota, de fracasso, de não realização, pois a meta, o propósito, o processo ganancioso, a impossibilidade de fracassar é soberana, é o único existente para nortear caminhos. A meta funciona como um redutor de tensão e de possibilidades, um açambarcador de desejos e propósitos que ilumina rotas e faz enxergar nas trevas. É uma atitude que exaure, cria medos, pânicos e desespero. A ideia de que tem que dar certo, tem que conseguir é avassaladora, faz com que o cego ande, mas faz também com

Fronteiras, humanização e transformação

Imagem
  Heródoto, o historiador e viajante, era muito impressionado com os preconceitos de seus compatriotas gregos em relação a outros povos, outras culturas e até mesmo à ideia vigente do que era o humano. Ele, em seus livros, em seus relatos de viagem procurou mostrar e ensinar a seus conterrâneos que a linha divisória entre barbárie e civilização nunca é uma fronteira geográfica entre povos e países diferentes, mas sim uma fronteira moral dentro de cada povo, ou melhor, dentro de cada indivíduo. Moral e ética são em última análise o que resulta da percepção do outro como uma individualidade, como o semelhante. Nesse sentido achar que o outro pode ser escravizado para trabalhar e aumentar os próprios lucros, achar que o outro é o objeto de prazer que deve ser explorado, ver no outro o substituto, o extra usado para o pior, não é ético, não é moral, não é humano. Usar, se deixar usar, negar direitos e possibilidades ao outro é cada vez mais negar-se como humano. Atualmente, as observações

Ambição e frustração

Imagem
É muito frequente as pessoas se perceberem inteligentes, capazes e habilidosas. Essas percepções, quando existentes em contextos que impossibilitam ou dificultam sua expressão, criam revolta, frustração e também ambição e ganância.  Sentindo-se especialmente inteligente e belo, por exemplo, mas não conseguindo ser reconhecido como tal, o indivíduo começa a construir seu caminho de realização criando metas, propósitos e projetos. Aparecem, assim, os que fracassam e os que conseguem. Quanto mais fracassos, quanto menos se aceita a constatação de não conseguir, mais revolta, inveja e agressividade. Essas pessoas formam a fileira dos ressentidos, e muitas vezes até mesmo dos marginais que tudo querem dilapidar. Por outro lado, quando são vitoriosos nas realizações de suas metas e objetivos desenvolvem maior ambição, insatisfação, vazio e desprezo pelo semelhante (que é então visto como inferior, igual a si mesmo) e a super valorização de quem pode lhes abrir portas por estar no alto da pir

Reações articuladas - espontaneidade e propósitos

Imagem
Agir ou reagir ao que acontece vai caracterizar atitudes espontâneas ou premeditadas. Em determinados contextos as reações aos acontecimentos são espontâneas: é o grito, a imprecação, a dor ao sentir o contato com o prego, com um caco de vidro ou uma topada em uma pedra, por exemplo. É espontâneo também a alegria ao encontrar alguém que se ama, ou o enfado diante de alguém que todo dia quer " contar um caso ", pedir uma ajuda, reclamar da própria sorte, do azar que julga caracterizar seu cotidiano. A espontaneidade dessas reações quase caracteriza o que se convenciona chamar de reação a estímulo, responsável pela abordagem determinante do condicionamento feita por behavioristas que esquematizaram as condições nas quais se estabelecem padrões de resposta, como vemos no condicionamento clássico de Pavlov e também no condicionamento operante de Skinner: "ao chegar diante do espelho ouço, vejo que ele me pede para escovar os dentes" . É assim que funciona toda a indústr

Estigmas

Imagem
    Estigma é a marca estruturada por preconceitos. É a predeterminação, a criação de categorias, de conceitos que se transformam em dogmas e a partir dos quais tudo é entendido e até mesmo digerido. Transformar um sinal físico em sinônimo de maldade, por exemplo, é uma atitude que atropela, engole ou destrói. Ao longo dos séculos proliferaram os estigmas tanto para o bem como para o mal. Ser pobre, ser rico, ser mulher, ser homem, ser branco, ser negro estabelecia critérios a partir dos quais o mundo e os relacionamentos eram configurados e entendidos. Quanto mais inclusivas se tornam as sociedades, mais os estigmas desaparecem. Há lugar e sentido para todos. Entre católicos se costuma dizer que "todos são filhos de Deus" e podem ser incluídos desde que sejam batizados, crismados etc. e isso neutraliza vários estigmas apesar de criar outro: é solucionador de controles, por um lado, derrubando muros separatistas, mas, por outro lado faz surgir os bons, diferenciando-os dos í

Mecânica dos mecanismos

Imagem
  No contexto do que é programado e mecanizado, se consideramos as engrenagens, uma parada inesperada do mecanismo possibilita o surgimento do que é espontâneo, ou seja, do não programado. Pensar a espontaneidade a partir da interrupção de programações anteriores contingencia o que é espontâneo, define-o como o não mecânico. Ser não mecânico e ainda estar contido nos mecanismos sistematizadores do mecânico é de extrema complexidade. Pensar o que é espontâneo independente de seus contextos é quase impossível, pois o espontâneo em relação a B pode ser o mecânico em relação a A. O que é espontâneo enquanto tal requer outros referenciais para ser apreendido. Seria o que salta aos olhos? De onde vem, de onde parte? É o que está contido em um outro referencial? É um antes? Um depois? Ou uma contingência transformada em contexto a partir do qual tudo agora é percebido? Terremotos e inundações, por exemplo, quebram os sistemas e seus sistematizadores. Criam outras configurações, outras ordens

Manipulação e mentira

Imagem
  Mentir é buscar se proteger da verdade, da realidade vivenciada. Saber que o que se faz é, no mínimo, criticável e não aceito, às vezes até criminoso, faz com que algumas pessoas procurem esconder ou despistar. A mentira é o álibi perfeito buscado para confundir os outros. Esse processo de confundir outras pessoas embaralha pistas para que não se perceba o que realmente está ocorrendo. Acreditar que a mentira é uma das formas mais simples de enganar os outros é parcialização dos processos. Quando se mente, se apaga rastros, se sonega verdades, se solapa evidências, criando, assim, outras evidências, outras verdades. Mentir é destruir acesso ao que aconteceu e ao que está acontecendo. Essa alteração de fenômenos sempre satisfaz a alguém ou a alguma ordem que se empenha a manter. As mentiras sociais e políticas, muitas vezes adiam processos históricos iminentes, outras vezes criam inclusive guerras destruidoras de nações e indivíduos. Nas famílias, nas esferas mais íntimas, mentir e o

Encapsulado

Imagem
  Sentir-se encapsulado é uma das reconfigurações de dinâmicas psicológicas criadas por novos posicionamentos. Esse posicionamento, responsável por conter ou ocultar vivências, desejos e constatações cria descontinuidades e assim faz com que o indivíduo encubra suas reais dificuldades, problemas, frustrações e medos.  É engenhoso encapsular vivências, constatações e percepções; estar constantemente a cortar e organizar, a superar e etiquetar (ressignificar). Uma das características principais desse posicionamento é o ato de encobrir. Ao embrulhar, etiquetar, organizar e guardar, se esquece, pois se encobriu o que estava espalhado, se ocultou o que parecia anômalo.  Nesse contexto, o trabalho, que vira motivação, é este: encaixar e definir para guardar e arquivar. Posicionado nesse universo, tudo que acontece só significa quando encontra seu complemento análogo, semelhante. É o eterno " symbolon " que na antiguidade grega era um sinal de encontro e reconhecimento (quando dois

Impaciência

Imagem
  Sentir-se impaciente é uma das reconfigurações de dinâmicas psicológicas criadas por novos posicionamentos. A impaciência é um posicionamento a partir do qual o mundo é transformado em fantasia. Tudo pode ser destruído em função da ordem, da sequência e do pensamento lógico, das falsas verdades e espúrios compromissos. Não conseguir acompanhar as dificuldades alheias, por exemplo, estar dedicado a realizar seus objetivos cria atmosferas nas quais o que ocorre é precário e despropositado. A superação de fatos, o abandono de dificuldades e do que pode atrapalhar gera ninhos onde se nutre a impaciência e até mesmo a intolerância. Ela resulta da constatação de incapacidade, da não viabilidade diante do que precisa ser resolvido. O impaciente, assim posicionado, se transforma no único capaz, tanto quanto no frequentemente abandonado e desconsiderado. Ao ser percebido dessa forma, ele é isolado. Sozinho com suas conclusões é deixado de lado para exercer seus processos de impaciência e dese

Tédio e liberdade

Imagem
  Não é muito frequente, mas acontece que a certa altura da vida não se tem porque lutar, não se tem o que descobrir, o que querer. Para muitos isso se resume em uma palavra: tédio. Tudo acontece sem dificuldade. A vida transcorre macia e monótona. Admitir que o tédio resulta de não ter que lutar ou de estar satisfeito é uma colocação reducionista que transforma o ser humano em um conjunto de necessidades, que quando satisfeitas o levam à homeostase e assim reduzem suas motivações. A luta vista desse modo é um processo voltado para redução de tensões e necessidades. No entanto o ser humano não é apenas um sobrevivente, um organismo condicionado, ele é antes de qualquer coisa alguém que diante do mundo percebe, pensa, interroga, caminha, descobre, enfim, transcende e estrutura processos outros, principalmente linguagem, questionamentos e dúvidas. Tudo isso pode ser resumido dizendo que o ser humano, orgânico, voltado para a sobrevivência, tem além disso, percepção de si, do outro, do mu

Polarização, cismogênese, divisão

Imagem
  Atualmente, no Brasil e no mundo, o que mais se comenta é a chamada polarização. Tudo convergir para uma opinião, transformando a mesma em verdade, é um absolutismo que neutraliza processos, exagera e diminui realidades, fatos e acontecimentos. Essa atitude de promover posições em função de convergências ou divergências é antiga e universal. Em 1935, o antropólogo e estudioso de psiquiatria Gregory Bateson criou o termo cismogênese (conforme ele próprio afirmava, desenvolveu esse conceito influenciado pela observação de comportamentos esquizoides) com o qual pretendia designar um padrão de comportamento que consiste na tendência de indivíduos ou grupos de se definirem por contraposição, pelos opostos e contrários em relação a outros, e assim aumentarem as suas diferenças no diálogo, interação e confrontação. Diferenças que antes da interação pareciam menores ou atenuáveis, tornam-se maiores e mais intransigentes à medida que ocorre a interação. Essas suas conclusões foram decorrente

Ira

Imagem
  Sentir-se irado, raivoso é uma das reconfigurações de dinâmicas psicológicas criadas por novos posicionamentos. Ter raiva ou a constante vontade de destruir resulta do acúmulo de frustrações e fracassos, obnubilando, solapando perspectivas.  Entregue a si mesmo, sem vislumbre de saída para realização de seus objetivos, o indivíduo transforma os outros que não o ajudam ou apoiam, em obstáculos, objetos a serem neutralizados. A ideia de supressão ou anulação como maneira de dominar e reinar é em si contraditória. Todo rei precisa de súditos. Entretanto, quando os mesmos existem, em alguns casos, o reinado e o rei são destruídos.  Nada deve atrapalhar, e a consequência dessa postura é estabelecer uma regra régia para sobreviver, que consiste em destruir tudo que é diferente de si próprio, e também o semelhante que é o espelho que desmascara. Na sutileza desse processo se desenrola o drama destrutivo. Não querer deixar rastros, destruir todos os indícios, faz com que o indivíduo se desfi

Fracasso

Imagem
  Sentir-se fracassado é uma das reconfigurações de dinâmicas psicológicas criadas por novos posicionamentos. Ao se posicionar como fracassado, o indivíduo reduz também todos os relacionamentos e vivências a resultados, a conquistas e vitórias. Essa contabilização ou mercantilização afasta e diminui a possibilidade de realização de seus propósitos ao tentar ampliar suas oportunidades. Educado para vencer, para não fracassar, aprendendo e pensando que o mundo é dos mais fortes, dos espertos e vitoriosos, ele se agarra ao que vai conduzir a esses resultados. Voltado para o futuro, para seus sonhos, seus desejos, e o que julga como seus direitos ou recompensas, ele não percebe, não vivencia o presente, não vivencia as frustrações e toda e qualquer dificuldade que contribua para sua desaprovação, estabelecendo assim, as bases de sua despersonalização: ele retira os pés do chão e caminha nas nuvens dos desejos. Sempre assim, pensando tudo pelos filtros decisórios do que vai impulsionar, do

A bondade

Imagem
  Sentir-se bondoso é uma das reconfigurações de dinâmicas psicológicas criadas por novos posicionamentos. Como diz o cantor Chico César: "Deus me proteja de mim / E da maldade de gente boa / Da bondade da pessoa ruim..." .  Qualquer posicionamento quebra dinâmica. Quando isso acontece surge comprometimento que pode passar a ser pódio, bunker ou trincheira de segurança ou de destruição, no mínimo de subjugação por mais bem intencionada que seja. As trincheiras da bondade geralmente são construídas em comunidades religiosas como uma forma de atrair adeptos ao prometer o bem e o melhor desde que todos se submetam e reine bondade: devoção, obediência, sacrifício, dedicação à divindade e ao sacerdote. A bondade institucionalizada também caracteriza e caricatura as várias faces do egoísmo e da vaidade. Instituições de caridade, orfanatos, abrigos de idosos são exemplares para mostrar as bondosas faces que o mal pode expressar. Ser bom, ser bondoso é uma senha quando essa caracter

Ignorado

Imagem
  Sentir-se ignorado, desprezado é uma das reconfigurações de dinâmicas psicológicas criadas por novos posicionamentos. A avaliação de vivências, seus resultados, faz com que algumas pessoas sintam ter "passado ou estar a passar a vida em brancas nuvens". Essa é a constatação dos sonhos falhados, de não ter nada construído, de não ter significado. Achar que é necessário ter sucesso, ser proeminente, enfim, fazer alguma coisa para justificar a vida cria os ávidos pesquisadores do que vai dar IBOPE, cliques e likes. É a vida voltada para o resultado, é o constante amealhar de elogios e comentários que funcionam como gorjetas ou propinas. Receber o óbolo, a gorjeta que aplaca é antes de tudo se colocar como expectante. O contínuo exercício dessa posição neutraliza expectativas. O que se recebe é sempre insuficiente, então é preciso mais. Vem a desonestidade, a contravenção, o ir até onde pode ganhar mais e receber o suborno, ajudas para viabilizar desejos, sonhos e metas. O desp

A vítima

Imagem
  Sentir-se vítima é uma das reconfigurações de dinâmicas psicológicas criadas por novos posicionamentos. Omitir-se diante do que ocorre, não enfrentar conflitos, esgueirar-se de contradições, "ficar em cima do muro" quando sequer há equivalentes de esconderijos faz surgir sulcos, descontinuidades. Esses vazios no decorrer dos processos relacionais estruturam posicionamento a fim de justificar e diminuir constatações lesivas para a própria imagem do indivíduo diante de si e dos outros. É frequente sentir-se culpado quando constata que se estivesse mais presente alguns acontecimentos poderiam ser evitados. Conviver com a constatação diária da falha, do erro, que quando não aceito é desagradável, cria culpa. A culpa, em certo sentido, é benéfica, pois justifica e desloca o sentir-se impotente diante do que acontece. Essa aparente vantagem da culpa como minimizadora de conflitos é ilusória. As dinâmicas existem, as situações não se resolvem por estarem escondidas, ou ainda, tudo

Compactação e contingência

Imagem
Reduzido aos estímulos do ambiente que o cerca o indivíduo constrói suas redes protetoras. Tudo é junção e encaminhamento de pontos, interseção de motivações, variação de narrativas e propósitos. Aos poucos suas motivações são transformadas em respostas pontualizadas ao que acontece. Guiado pelas circunstâncias, pelas contingências, ele ri ou chora conforme tambores agudos ou címbalos discretos. Quando a motivação é transformada em resposta estruturada pelas contingências, ela não é mais a pergunta que tece redes, que rascunha caminhos e decisões. Seguir a própria marcha, manter-se coeso e determinado pode ser alienador, pois pode decorrer de uma deliberação prévia: como sobreviver. Qualquer prévio, qualquer pergunta que busque resposta como definidora de caminhos, está comprometida. O compromisso organiza, mas é também o preto e branco entediante, é o sistema sobrepondo-se ao sistematizado, a família sobrepondo-se ao indivíduo, o grupo sobrepondo-se à unidade, o esperado sobrepondo-se

Irrecuperável

Imagem
    Ao constatar a falta de possibilidade em recuperar o que foi estragado, o que é desejado ou o que foi perdido surge a vivência de irremediabilidade. Nada mais pode ser feito e o que se fez é o que causou a impossibilidade. Contradição e antagonismo de tanto atritarem criaram fossos, buracos e vazios. São dois pedaços, não há comunicação, salvo as de memória e desejo. Não suportando essa vivência e não questionando seus referenciais de contradição, as divisões proliferam. De um lado a pessoa boa que tudo possibilita, de outro, a mesma pessoa que é a que tudo dificulta e atrapalha. Não se constatando as divisões arbitrariamente realizadas, não se enxerga o abismo relacional configurado. Melanie Klein já falava no desespero e na culpa da criança que entra em crise ao descobrir que o "seio bom e o seio mau" fazem parte da mesma pessoa: da mãe. Chamo atenção para esse exemplo da psicanálise kleiniana apenas para corporificar, exemplificar a questão. Na realidade a culpa não de

A coisa mais retrógrada...

Imagem
  A coisa mais retrógrada em um dado momento pode ser aquela pela qual se luta. Para entender essa afirmação é necessário perceber as defasagens do tempo. O que passou não mais existe e o que ainda não aconteceu, tampouco. Só existe o presente, no caso só existe a luta. Entretanto, muitas vezes os objetivos que fundamentam a luta não existem, não estão presentes. Lutar pelo que não existe é quimera, sonho, ilusão. No âmbito afetivo relacional querer recuperar afetos perdidos com considerações desgastadas é ilusão, é um faz de contas negador dos desgastes e erros por exemplo, assim como no âmbito político social querer levar os menos privilegiados a recuperar direitos pode ser apenas desejo de realização do próprio sonho. Vida é movimento, é processo. Novos contextos, novas redes, novas configurações relacionais. O direito de ontem, não é mais o de hoje, nem será o de amanhã. A luta, muito próxima do desejo, se confunde com ambição, perseverança, ganância e nesse sentido impermeabiliza

Entraves e bloqueios

Imagem
    À parte as pessoas com lesões cerebrais ou nervosas identificadas, a dificuldade de expressão - principalmente de diálogo - na fala, na exposição de pensamentos é, frequentemente, entendida como "déficit cognitivo" ou "bloqueio emocional" . Essa particularização, situando os problemas de expressão e de fala na esfera cognitiva ou emocional, é precária pois decorre de visões elementaristas dos fatos psicológicos. Não são as funções cognitivas - de conhecimento - nem são as emoções os iniciantes ou deflagradores de problemas. Não existem essas particularizações. O que existe é um indivíduo no seu mundo, que reduzido às funções de obedecer, por exemplo, de não criar problemas e se controlar desenvolve bloqueios. Assim ele é educado, assim cresce e se percebe só, sem o outro que o encontre, que o situe. São referenciais, são regras, deveres que, quando obedecidos não geram conflito, mas que ao contrário, quando não obedecidos geram reclamações. Seguir a linha, não

Ignorância

Imagem
  Não conhecer, não discriminar, ou seja, a ignorância é a responsável pelo posicionamento. Isolar-se nos próprios referenciais e traduzir o mundo a partir dos mesmos é falar uma língua, desenhar direções, estabelecer critérios impossíveis de compartilhamento. Posicionado em seus referenciais e critérios o ser humano se isola e então precisa estar sempre pendurado em redes que o identifiquem e protejam. Desse modo ele é um apoiador ou um contraditor. Ele é rótulo, e também rotulado. É vítima e é agente. Não conhecer resulta de não questionar, não ampliar referenciais e assim só se pode viver em locais conhecidos, determinados e rotulados. O ignorante é o que se candidata às aflições e desespero humano que vemos no auto-sacrifício, no egoísmo, no apego, no poder e sucesso, na aversão e no medo da morte. Ignorante é o que não se percebe como ser humano com possibilidades e necessidades. Ignorante é o que acha que ao satisfazer as próprias necessidades tudo estará resolvido, isto é, se re

O medo da morte

Imagem
  Ao antecipar o futuro, ao continuar as implicações do que ocorre caminha-se para abismos, pois não há terra onde caminhar. No seu processo de vida o indivíduo descobre que existem finais. A morte, o cessar da vida é um desses finais comuns a todos os humanos. Esse conhecimento é tão simples e completo quanto saber que se é um corpo, um organismo constituído de células, tecidos, órgãos, que se mora em uma cidade, que se tem uma família. É uma informação, um referencial. Certos acontecimentos, e o passar do tempo, tornam relevante e pregnante a constituição finita do humano. A dramaticidade ou não dessa pregnância depende de quem, como e quando é vivenciada. Os limites, a doença, a idade, a época, a pandemia, a guerra, tornam muito próximo esse referencial, sempre percebido como condição humana, embora distante. Quanto mais próxima a possibilidade de morrer, maior a aceitação ou a não aceitação, menor ou maior o medo da morte. A morte quando vista como decorrência do processo de vida,

Aversão

Imagem
  Toda vez que alguma coisa ou alguém é excluído de uma situação ou sistema podemos dizer que a aversão, o não suportar, o detestar, o não querer conviver com aquela pessoa ou situação foram os responsáveis pelo comportamento de exclusão. De uma maneira geral podemos resumir a aversão em dois grandes grupos: as resultantes dos a priori ou preconceitos, e as resultantes de dor, sensação intolerável. Os preconceitos existem nas diversas culturas e sociedades e criam comportamentos de aversão: evitar o diferente (etnia, posição profissional, posição social e econômica); a discriminação aos fisicamente deficientes (lesados ou portadores de comprometimento francamente visíveis , assim como os que não são considerados belos, bem vestidos); e acontece também evitar o familiar, pois o mesmo pode desmascarar projetos, pode saber "o caminho das pedras" e assim pôr tudo a perder. É comum o novo rico odiar encontrar os vizinhos da comunidade onde passou a infância. É comovente ver o dese

Perdido em função das circunstâncias

Imagem
  Quando o indivíduo se define e situa pelo que o apoia, sustenta, anima e satisfaz, ele se contingencia. Estar em função das circunstâncias, variando segundo flutuações obriga a ter barcos, bússolas e outros instrumentos para estabilizar o percurso. Não se bastar, estar definido pela família, pelo dinheiro, pelas instituições religiosas, acadêmicas e outras que o abrigam e molduram é sempre despersonalizador. Não se sabe como viver sem ajuda financeira da família, não sabe como abrir mão do caudal de benesses conseguidas via universidades, organizações partidárias, comissões de cargos vitalícios etc. A dependência é uma constante na vida desses guardiões de vantagens e conveniências. Pensões sempre transferidas, cargos que se perpetuam, "golpes de baú", benefícios conferidos pela instrumentalização da beleza, ou da inteligência criadora de diferenciais, mesmo que engolidos por sistemas comercializadores, tudo isso é sempre valorizado quando há apego ao que propicia as conven

Egoísmo - tudo em volta de si mesmo

Imagem
Quando o indivíduo se coloca em destaque cria posicionamentos. Esse destaque pode ser de vítima ou de opressor, mas é sempre o de ponto de confluência, encontro de variáveis configuradoras de processos. Estar posicionado é manter-se no pódio vitorioso ou na depressão engolidora que foi para ele construída, ou que ele construiu ou escavou. Estar parado - a negação da dinâmica, o posicionamento - é neutralizador de processos. Tudo ocorre e o lugar da vitória ou do fracasso é mantido. Os que se sentem vitoriosos, e também os que se sentem desesperados, os que se sentem perdidos têm lugares cativos e fazem qualquer coisa para mantê-los. Para um indivíduo assim, a vida é considerada difícil, tudo é perigoso de adquirir, perigoso de perder, ele tem que se posicionar e então garantir o conquistado, ou perceber que o que quer não pode ser conseguido. Resolve que é preciso ficar quieto em seu lugar para ver se alguma vantagem ou ajuda surgem.  Essa atitude de se colocar na confluência dos proce