Zeitgeist ou espírito da época

A ideia de Zeitgeist perpassa a obra de Hegel, pensado como processo histórico. Zeitgeist é um conceito básico e intrigante para compreensão da trajetória, do comportamento humano.

A atmosfera da época, o contexto dos anos, existe independente das culturas de cada nação ou é típico das nações mais adiantadas economicamente e passados para as outras. Admitir isto, implica em admitir transformações superestruturais independente de suas infraestruturas. Ocorre que os sistemas, sociedades ou culturas, comunicam-se de diversas maneiras, têm camadas, aspectos relacionados a outros sistemas, sociedades ou culturas diferentes de seus estruturantes. Esta flexibilidade, dinâmica reversível, permite criar denominadores comuns - é a atmosfera, espírito, feições, modas, configurações fundantes à partir das quais frequências são estruturadas e sintonizadas.

Processo incrível, permite semelhanças: todas as fotos do século XIX são parecidas; desde a sépia, o resultado daguerreótipo, até as feições, chapéus, casacos etc. Suecos, portugueses,  javaneses e nigerianos, por exemplo, participam do mesmo Zeitgeist. O que se lê, o que se pensa, o que se discute, como se ama, o que é crime, o que é pecado, honra, são decididos neste contexto, nesta atmosfera.

Nosso passado é comum, nosso futuro também o será independente de quaisquer características individuais. Antes do avião, antes do computador, antes das câmaras de gás, assim como depois de tudo isto, são passagens, manifestações do Zeitgeist.

Este contexto comum é também responsável pela massificação e cópias, devido a superposição que cria. Cartola e fraque nos trópicos é um exemplo de transposições absolutizadas pelo espírito da época.

Atualmente este espírito, o Zeitgeist, está sendo substituído, manipulado, quase que criado pelo mercado, perdendo assim sua característica de atmosfera, virando subproduto, resíduo reciclado sem raízes fincadas em processos, fincadas na história, por exemplo. Arbitrário, o espírito da época se transforma em políticas defasadas, em modas massificadas e nichos nostálgicos para a impotência, o medo e a depressão.

















"Viaje a Oriente", de Gustave Flaubert
"Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister", de Johann Wolfgang von Goethe

verafelicidade@gmail.com

Comentários

  1. Vera,
    Incrível seu texto. É assustador pensar como esse zeitgeist, essa atmosfera de uma época, é manipulado pelo mercado (e pela midia a serviço deste) hoje em dia. Muitas vezes não percebemos como grandes interesses econômicos influenciam opiniões e direcionam comportamentos de massa. Estamos perdendo o nosso "espírito da época" e, ao mesmo tempo, nossa individualidade, não é? Precisamos estar inteiros para não nos deixar levar por essa massificação.
    Bjs.

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    1. Obrigada, Iona.
      Ser inteiro, ser fragmentado, independe de determinação e vontade, é um processo, não tem preexistências. A individualidade é estruturada em função dos processos de aceitação possibilitados pelo outro. O espírito da época, Zeitgeist, não pode ser alienante ou individualizante, apenas gera atmosferas, padrões, responsáveis por ornamentos, levezas superestruturais ou cópias grossseiras do que se quer imitar.

      Beijos

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  2. Como você analisa a relação entre globalização e zeitgeist? Abraços!

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    1. A globalização é toda esta manipulação e prepoderância econômica, enquanto mercados, que homogeneíza culturas, como explico no último parágrafo do artigo. Abraços, Vera

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  3. Excelente texto. Vejo o Zeitgeist como uma coisa indomável, ele é obra de uma série de fatores muitas vezes incontroláveis pelo homem. A tentativa de manipular o Zeitgeist em que vivemos é apenas a tentativa desesperada de alguns de impedir o desenvolvimento da humanidade. O Zeitgeist de nossa época atual é o descortinar o véu da mentira e da falsidade. É a busca da Verdade íntima. É o pleno desenvolvimento das ciências, da espiritualidade e da sociedade como estrutura saudável e equilibrada.
    O problema é que a tomada de consciência dos problemas em que estamos vivendo sempre é muito doloroso e turbulento, mas é necessário e passa.
    A senhora, enquanto psicóloga sabe melhor do que eu, que o lixo precisa estar visível para ser varrido e reciclado. E que toda emoção significativa reprimida torna-se sintoma, e o sintoma nos traz dores.
    É este o momento que vivemos. O reconhecer do lixo que sempre esteve em nossa sociedade. E ele já está acontecendo e ninguém poderá impedir.
    Bem vinda Vera, a era de Aquários. Quer dizer... Ao Zeitgeist de Aquários. Enfim chegamos.

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  4. Vera, o Zeitgeist está acontecendo, quer se queira ou não. Não vejo como sendo substituído, manipulado talvez. Mas quando não o foi? É como vejo, tenho de refletir mais... Gostei do comentário do 5 . (só hoje descobri seu blog precioso! o kafka (curso e autor) me acompanha até hoje!) bjs

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    1. Que surpresa Ana! Quanto tempo, não sei seu sobrenome, tive mais de uma aluna Ana no Kafka. Bons tempos aqueles! Obrigada pelo comentário. Adorei saber que você continua acompanhada por Kafka. Ana, para entender melhor a minha afirmação sobre substituição e manipulação do Zeitgeist, situe no contexto do neoliberalismo, onde produto e mercado são marcos definitivos. Beijos.

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    2. Reli, repensei , acho que estou entendendo a sua colocação. Atmosfera virou subproduto... bj

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    3. Reli, repensei. Acho que entendo a sua colocação. Atmosfera virou subproduto. bj

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    4. Perfeito Ana!

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