Utilizar, enganar, exibir
Nas diversas dificuldades comportamentais, nas impossibilidades de convívio social, familiar e de trabalho, quando se deixa de lado as problemáticas, as não aceitações que definem e caracterizam o viver, nessas situações frequentemente é estabelecido um vazio, a despersonalização. Não se sabe o que fazer, salvo se entregar ao medo, à depressão, à inveja, à raiva e ao desespero. Nesse quadro, quando surgem pequenas melhoras de ânimo, os indivíduos resolvem disfarçar suas histórias, suas vergonhas, suas características. É o clássico ir à loja e comprar muito, para dissimular; é o clássico copiar e editar perfis, frases e comportamentos alheios. Não há critério para as utilizações, tampouco para os objetivos de enganar - o que se quer é ser diferente, exibir nova fácies, novo aspecto: cultura, riqueza, status. Mas viver tentando ser diferente do que se é, ocultando as próprias dificuldades, é índice revelador de problemas. As apropriações criam mais problemas. Não se sustentam, fenecem ao menor toque de realidade. A precariedade do processo cria instabilidade e mal-estar. Cada vez mais escamoteados os indivíduos choram, brigam, adoecem e esperam redenção, ajuda, alguma restituição que possa trazer bem-estar. Acontece que não há o que restituir, pois só houve apropriação. Constantemente esta esperança de resgate para a vida cria desespero. Não se quer esperar, se quer continuar e tudo passa a ser escondido e emprestado. Admitir que as não aceitações e dificuldades não podem ser escondidas é o caminho que se abre, é o único caminho que propicia mudança, personalização, bem-estar. Viver a própria vida, conviver com o que o circunda é um milagre que se insinua quando o indivíduo se detém na própria problemática, na não aceitação de sua vida, de suas necessidades e possibilidades.
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