Sistemas e robôs
Fundamentados no lucro, mais valia, exploração, habilidades e direitos, os sistemas sociais - desde a família às regras educacionais e legais - se esmeram na produção de robôs bem acabados ou com avarias de fabricação. Não há lugar para o humano. Doença, neurose, drogas, não aceitação, desespero e maldades surgem.
As psicoterapias, são as ilhas onde as paradas e pausas deste processo desumanizador podem existir. Entretanto, para que aconteça transformação é necessário questionamento a todo processo de adaptação em função dos valores desumanizadores. Geralmente isto não ocorre. O que se vê nas terapias é o chamado "recarregamento de baterias" para enfrentar e manter as raivas, invejas, desejos e justificativas.
Situações extremas, excruciantes geram sempre a pergunta: sobreviver para quê? Viver para quê? Muitas psicoterapias, pelo compromisso que têm com o sistema, conseguem transformar estas perguntas em meros sinais, em símbolos, dizem: "perguntas são interrogações, interrogar é procurar o significado, o sentido, a justificativa de ser humano, de ter problema, quem não os tem?" Obviamente este aplacamento permite reciclagens. Latinhas amassadas podem ser reutilizadas, isto é muito eficaz. Atritar, amassar é recondicionar, é crescer, mas com esta visão temos mais doença, mais desumanização necessária para manutenção do sistema.
Que fazer? Acirrar cada vez mais as contradições, mostrar que o que é valorizado não significa enquanto liberdade, alegria e tranquilidade, que as trancas e blindagens para garantir o que se conseguiu, sem medo, pânico, depressão não funcionam.
A inveja, o ódio, a ilusão, o "lutar pelo próprio bem" pela própria crença são os fetiches, as bandeiras identificatórias de grupos e pessoas que estão irmanadas por estas atitudes.
Os sistemas do robô, da desumanização são mantidos pela apatia, pela depressão. A abulia é assim necessária para seguir ordens. O abúlico, o sem vontade, é fragmentado, pontilhado e paradoxalmente sempre está verificando qual é a sua vontade, qual o seu lucro, o que os outros conseguem e ele não. Nesta ordem estabelecida de sistemas e robôs não há o humano. Nietzsche falava no "super-homem", naquele que via esta mecanização e conseguia ficar fora e além da mesma. Só resolvemos esta complexidade quando nos esvaziamos dos desejos, quando nos questionamos, permitindo não sermos cooptados pela vontade de vencer, de melhorar, de conseguir. A meta gera o vazio individual que é alimentador do sistema social. Ser ambicioso, esperto, tirar o outro da frente, não ter compaixão é a marca do vencedor, do títere social.
Se deter nos próprios problemas, entender suas contradições, entender o próprio vazio é humanizador. Enfrentar estes problemas, ver como eles foram estabelecidos, gera mudança. Esta individualização diversifica a homogeneização dos sistemas, dos valores. Antíteses surgem e o sistema já não mais determina o que é bom, o que é ruim; o sistema será o contexto, o espaço onde se vive, quase que sinônimo de uma paisagem física.
- "Jamais fomos modernos", de Bruno Latour
- "Job et l'excès du mal", de Philippe Nemo
- "O mal no pensamento moderno", de Susan Neiman
- "Job et l'excès du mal", de Philippe Nemo
- "O mal no pensamento moderno", de Susan Neiman
verafelicidade@gmail.com
Gostei do titulo mas tenho que fazer psicologia com desenho animado
ResponderExcluirFaça sim. Abs
ExcluirNão tinha lido este ainda. Gostei muito, desta vez lembrei do "Investigação sobre um Cidadão Acima de qualquer Suspeita"
ResponderExcluirOi Augusto, seu conhecimento cinematográfico é enciclopédico, parabens!
ExcluirAbraço