Avidez
Estar submisso, ser desconsiderado, ser invisível (pobres, desempoderados, idosos, mulheres às vezes) gera revolta, gera medo e não aceitação. A carência afetiva, nestes contextos e estruturas, é transformada em necessidade de relacionamento, surgindo assim, distorções, perversões e dependências relacionais.
Ao não se aceitar, o ser humano observa e deseja padrões aceitáveis, cogitando que se atingí-los, vai ser aceito: seu mundo vai mudar, vai ser amado, considerado. No Brasil colônia, ou até pouco tempo atrás, ser negro ou aparentar qualquer sinal de negritude era responsável por não aceitação. É bem conhecido quão danoso foi o chamado "processo de branqueamento" em termos sociais e também enquanto realidade psicológica geradora de não aceitação; atualmente as denominadas auto-estima e cidadania plena, escamoteiam os processos discriminatórios.
Na avidez de ser aceito, tudo se faz, tudo se busca para realizar esta motivação. Na adolescência, este processo é nítido: "gangs", "pegas", funcionamento programado pelos grupos aos quais se adere mostram a avidez de ser considerado, ser visto como capaz, independente, corajoso. Submeter-se para conseguir é uma estratégia gerada pela não aceitação deslocada sob forma de carência relacional. Submeter-se aos desejos da raiva, da perversão exercidas pelo outro é uma maneira de se sentir útil, amado, considerado. Ser espancado, às vezes, é uma forma de manter o provedor, o protetor, de aplacar a avidez, o vazio resultante da falta de perspectivas.
A violência urbana gerada por processos econômicos está também estribada na busca de afirmação autorreferenciada: "meu reino por um amor" agora existe sob a forma de "meu reino por um tênis", por um contato de pele. Virando massa de manobra não só de sistemas, mas também de famílias, se busca viver, sentir alguma coisa.
A avidez, quando satisfeita, alivia e sacia para imediatamente gerar mais avidez, mais desejos. Quando tudo parece estar resolvido e estabelecido, se pode então conquistar o que se anseia, o que falta; mas, basta pensar no relacional e humanamente esgotado, falhado, para se perceber um círculo vicioso, perverso e danoso.
- "Desespero e Maldade" de Vera Felicidade de Almeida Campos
- "Délire" de Ludwig Binswanger
verafelicidade@gmail.com
Excelência e construtividade o seu Blog, conterrânea! Abraços.
ResponderExcluirObrigada Juscelino, abraço, Vera
Excluir