Desentendimentos
O relacionamento entre duas pessoas cria desentendimentos quando os acontecimentos são percebidos em função dos referenciais específicos de cada pessoa. Memórias, não aceitações, autorreferenciamentos, frustrações geram atitudes de desconfiança, concorrência, afirmação de pontos de vista e utilização de oportunidades como afirmação dos próprios desejos de ser aceito e considerado.
Quanto mais o contexto, quanto mais a vivência do presente é o denominador dos relacionamentos, mais neutralizadas são as diferenças individuais, entretanto, os antagonismos causados pelo autorreferenciamento, pela não aceitação, pelas problemáticas não resolvidas, interferem, pois não são neutralizados, são apenas acobertados, contidos pelos interesses comuns. Quaisquer expectativas não atendidas de um dos indivíduos, causa desequilíbrio, quebra o contexto comum e remete às configurações individuais. Discussão, desentendimentos, agressões, surgem.
Nos relacionamentos nos quais predominam desentendimentos é constante a falta de motivação para o dia a dia, as pessoas procuram se refugiar e se proteger em suas aspirações frustradas e geralmente transformam os problemas em justificativas. Vitimizar-se é uma tentativa de salvar o que resta, de amealhar resíduos de incompatibilidades e desencontros, é também estabelecer-se como poderoso(a), curador(a) de mazelas e propiciador(a) de melhoras e mudanças, é uma forma de ratificar domínio e autoritarismo. Desentendimento resulta da necessidade de ser aceito pelo outro dentro dos próprios padrões e critérios autorreferenciados.
Quando duas pessoas olham apenas uma para outra não há desentendimentos, entretanto, olhando na mesma direção, para o que está diante delas, desentendimento se impõe, pois surgem as apreciações valorativas; critérios se interpõem ao percebido e assim aparecem as diferenças. Esgotar-se no olhar o outro e ser por ele olhado cria, no mínimo, um contexto de entendimento, de familiaridade à partir do qual os acontecimentos são percebidos. Este denominador comum homogeneíza diferenças e permite compatibilidade, encontro, entendimento.
- “A Morte nos Olhos” de Jean-Pierre Vernant
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