Antítese e oposição

A dialética dos processos consiste em antíteses, em oposições, entretanto, nem sempre se vivencia este processo, nem sempre se vivencia este movimento, pois se está ancorado em algum bem-estar ou mal-estar. Imaginar que não pode quebrar, que não pode mudar o momento feliz, que não pode mudar o processo considerado perfeito ou, por outro lado, que nada vai salvar nem mudar a infelicidade do que se vivencia, é um exemplo deste pensamento, deste autorreferenciamento otimista ou pessimista.

Tudo muda, tudo se movimenta, este é o contexto humano, tanto quanto sempre podemos estar posicionados, sempre podemos estar situados. As passagens são feitas em volta de referenciais, e a percepção da imutabilidade, às vezes da eternidade, daí decorrem. A continuidade deste estado gera uma vivência de não contradição, mas esta vivência é tanto realizadora, quanto anestesiadora. Estas possibilidades antagônicas - dualidade - são uma maneira de recriar movimento, de recriar contradição. As grandes histórias de amor, seus temores por exemplo, estão ancoradas nesta reversibilidade. É o desejo de eternizar o instante, o popular “por que não paras relógio…” é a contradição, é o estar no mundo com o outro, sendo um organismo cheio de necessidades e repleto de possibilidades.

Sem antíteses o processo se encerra - a morte do indivíduo, por exemplo, embora continue como matéria orgânica, já não é personalizada, não há intencionalidade, não há consciência. Vivenciar a não antítese é estar entregue a si mesmo, isto pode configurar disponibilidade, tanto quanto explicar o autorreferenciamento no qual o indivíduo se sente só e único no mundo, tendo os outros à disposição de seus quereres e necessidades.

Nas vivências de disponibilidade as contradições são vivenciadas como constatações, não há avaliação, ou seja, o processo não é visto como impedimento. Estar disponivel resulta de vivenciar o que ocorre enquanto evidência, sem avaliações ou cogitações.

Nas vivências autorreferenciadas as contradições são vivenciadas como obstáculo que tem de ser transposto, destruído ou negado.  Os propósitos e desejos, metas e planos são as regras que determinam tudo, as contradições são negadas, só existem obstáculos há vencer ou o medo de fracassar.

Sempre é estruturante e humanizador perceber as contradições existentes, como elas se relacionam, modificando-as, transformando-as em constatações ou integrando-as. Desconsiderar a dinâmica é criar desertos reais, que obrigam imaginar castelos de areia sempre simbolizados por situações de medo, dúvida e pânico.


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