Variações e identidade


 


Todos percebemos igual tudo que odoriza enquanto ato de cheirar. A comida, por exemplo, pode ser percebida como odor, assim como tudo o que tem gosto é percebido como gosto. A igualdade da percepção se refere às estruturas das diferenças perceptivas, é equivalente a dizer que gosto é gosto, cheiro é cheiro, tato é tato, audição é audição, visão é visão. Entretanto, na igualdade do gustar, do cheirar, do tocar, do ouvir, do ver, tudo é diferente, existem características específicas individuais. A trajetória do dado é variável. Os receptores são tonalizados pelas características individuais de seus estruturantes, de seus contextos. O cheiro ácido do limão é uma fragrância variada em função de outros contextos olfativos, de misturas e interferências que podem neles neutralizar quaisquer percepções. Existem odores, gostos típicos e significativos, assim como sons expressam realidades e sentidos semânticos, como enxergamos o que está difuso, e o mesmo se aplica ao que ouvimos e pegamos.

Os significados variam em função das realidades individuais. É a efetividade de Figura e Fundo que transforma dados e contagia resultados. A mão que acaricia pode ser a mão que ameaça a depender das cristalizações vivenciais enquanto medo e dor. Ter sido apunhalado transforma qualquer contato em medo e ameaça. Ouvir gritos à beira do despenhadeiro impede distinguir mensagens. Sair de celas de tortura após punições cria revolta que impede discriminar boas maneiras ou mensagens animadoras. Ouvir o que é falado pode se transformar na mais difícil tarefa a empreender se existe medo, omissão diante do outro. Expectativas exacerbam e amplificam dados, tanto quanto encolhem evidências. Estar diante do que ocorre requer disponibilidade, enfrentamento e renúncia de metas (desejo) e a priori (medos).

Estar limpo, entregue, aberto ao que está acontecendo é o que possibilita apreender o que ocorre. A evidência é o que está acontecendo e isso só é percebido quando se fica diante, inteiro e voltado para o que está se dando. Identificar é abrir mão de possibilidades, de contingências e necessidades. É voltar-se para o que ocorre independente de significado, valores e garantias. Estar entregue ao que acontece é a única maneira de perceber o que acontece. Estar imerso é estar diante do que se oferece sem antes nem depois.

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