Fronteiras, humanização e transformação


 
Heródoto, o historiador e viajante, era muito impressionado com os preconceitos de seus compatriotas gregos em relação a outros povos, outras culturas e até mesmo à ideia vigente do que era o humano.

Ele, em seus livros, em seus relatos de viagem procurou mostrar e ensinar a seus conterrâneos que a linha divisória entre barbárie e civilização nunca é uma fronteira geográfica entre povos e países diferentes, mas sim uma fronteira moral dentro de cada povo, ou melhor, dentro de cada indivíduo. Moral e ética são em última análise o que resulta da percepção do outro como uma individualidade, como o semelhante. Nesse sentido achar que o outro pode ser escravizado para trabalhar e aumentar os próprios lucros, achar que o outro é o objeto de prazer que deve ser explorado, ver no outro o substituto, o extra usado para o pior, não é ético, não é moral, não é humano.

Usar, se deixar usar, negar direitos e possibilidades ao outro é cada vez mais negar-se como humano. Atualmente, as observações de Heródoto são mais que fundamentais. Abrir horizontes ou ampliar perspectivas se consegue quando se amplia as fronteiras da humanidade enquanto tal.

Quanto mais os feudos de ambição, de oportunismo, de submissão do outro, de, por exemplo, transformação do corpo em objeto de luxúria e reposição de órgãos vitais para a sobrevivência, quanto mais ocorre tudo isso, mais desaparece o ser humano dos sistemas e sociedades. A fome, a doença, a transformação do humano em material genético para experiência, para elucidação de processos e crises é desanimadora. No tempo de Heródoto cada nova sociedade, cada novo sistema social descoberto gerava espanto diante das novidades e trazia mudanças. Atualmente são criados os seres vazios, sem regras, sem futuro a depender de sua moeda para compra. Hoje em dia, 50% da Índia, 40% da África (e outros contingentes populacionais) não são vistos como seres humanos, são números, paisagens e panoramas que clamam por ajuda, e denunciam o que se acredita ser humanidade civilizada ao exemplificar a barbárie por ela perpetrada.

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