Fissuras e revelações

Toda descontinuidade, divide, cria separações. Quebras, rachaduras podem ser consertadas gerando o que se constitui em disfarce do que foi dividido. Terceiros fatores, outras variáveis, normalmente revelam estas emendas. Situações reveladas e desmascaradas sempre existiram. Não há como controlar o inevitável: a dinâmica relacional que subverte e questiona posicionamentos.

Os contextos relacionais, as contenções, as irregularidades não revelam as estruturas comprometidas pela divisão mas explicitam os limites possíveis do estar bem. Adaptação, desadaptação ao limite do outro expõem dificuldades, acertos e negociações realizadas para manutenção da boa ordem familiar, do emprego conseguido, do status almejado, por exemplo.

Consertar é reestruturar, mas quando acontece como uma emenda, arrumação e disfarce se constitui em um limite. Disfarces não resistem às transformações; são contextos onde é impossível tirar implicações do que ocorre quando esta ocorrência está mantida dentro de padrões e regras que as definem como um cessar de possibilidades. Pensar, tirar conclusões é visto como perigoso, pode quebrar toda a ordem constituida, a harmonia a ser preservada. Não pode haver questionamentos, pois geram desequilíbrio. O importante é manter o que está arrumado, disfarçado.

Filhos sempre questionam à medida em que se constituem em um novo; por mais que estabelecidos e enquadrados, alguma atualidade - novo contexto - existe. O questionamento realizado pelos filhos é uma fissura, uma quebra, uma divisão, que trará mudança, reconstrução ou novos consertos, disfarces e acúmulo de situações não enfrentadas, consequentemente mais compromissos, mais posicionamentos, imagens e disfarces.

Infinitas situações podem criar rompimentos, responsáveis por questionamentos e reestruturações ou emendas e disfarces.


















"Em busca da unificação", de Abdus Salan, Paul Dirac e W. Heisemberg
"Minha irmã e eu", de F. Nietzsche

verafelicidade@gmail.com

Comentários

  1. Olá Vera, esse artigo me fez pensar nas dolorosas quebras que surgem nos relacionamentos quando acontecem traições ou quando se é surpreendido por facetas do outro que não se percebia antes, por exemplo. Muitas vezes se tenta ajeitar, acomodar, mas algo se quebra para sempre, neste caso não só no relacionamento, mas nas próprias pessoas que podem sair transformadas e livres ou permanecer arrasadas e comprometidas. Se entendi bem seu texto, aceitar, participar, enfrentar as situações de ruptura é o que permite a unidade e reestruturação.

    Abraço

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    Respostas
    1. Exatamente Ana, toda divisāo tem sempre um ponto de unificação. No caso de alguns relacionamentos, às vezes a unificaçāo é também divisão em outros níveis, que ao possibilitar questionamentos permitem reestrututação ou manutenção.

      Abraço

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    2. duas pessoas se encontram, e construem um mundo paralelo, onde tudo ocorre aparentemente bem, até que o vidro se quebra.. e o falso ponto de união é quebrado, é exposto.. a relação nunca existiu e as muletas que eram utilizados para manter, não se encaixam mais.. é preciso romper.. mas a vivência estava tão moldada com o "acordo" que no primeiro momento não se enxerga que é preciso sair do tunel... até que finalmente é percebido que o ponto não é de fusão e sim de separação.. e mesmo dolorido, as vezes até carregando as culpas, saimos para o mundo.. e neste momento é preciso atenção, pois podemos cair numa relação mas "pobre" se "culpas" são carregadas.. e assim passam anos.. ai vem Vera Felicidade e esfrega na nossa cara o obvio.. cai a ficha...

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    3. Oi Regina, boa explicaçāo você deu! Deixa bem claro que tudo vai depender das estruturas de nāo aceitaçāo envolvidas na relaçāo, daí a importância do questionamento e da globalizaçāo dos problemas, coisa muito difícil em estruturas divididas.

      Beijos

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  2. Oi, Vera.
    Realmente, as transformações não podem ocorrer com remendos e disfarces e há um momento em que ajustes já não satisfazem mais. Percebemos que, na verdade, não há harmonia a ser preservada e a ordem estabelecida é hipócrita. Então é preciso parar tudo e encarar seus limites de frente, se dedicar ao que acontece.
    Me lembrei do filme "A Tentação", que trata disso também: você estar inteiro diante do que acontece, diante dos seus limites. Muito bom o filme!
    Bjs

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  3. É isto mesmo Ioná.
    Quanto ao filme "Tentação" o importante nele é a ênfase dada às cadeias, os a priori, sejam os religiosos, sejam os posicionamentos resultantes de vivências que quebram possibilidades de iniciativa e desacomodação.

    Beijos.

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