Avatar
Relacionamentos com o outro em função de contextos e situações vivenciadas em comum, tendem a se transformar ou a estagnar. As transformações são realizadas pelo processamento, pela continuidade do próprio relacionamento, do diálogo e encontro. Estruturam-se novas dimensões, surgem detalhes e intimidades são estabelecidas.
Quando o desenvolvimento relacional é baseado no que se deseja mostrar, manter ou conseguir, não surgem novos contextos relacionais, e ficar dando voltas em torno do mesmo ponto esvazia, monotoniza. É a repetição, é o embaçamento do que poderia ser novo, do que poderia brilhar, do que poderia aparecer. A segurança de ser aceito dentro dos padrões mantidos é tão esvaziadora quanto, por exemplo, o que se vive na esfera da família, na qual o que aparece, muitas vezes, é apenas o apoio institucional da mesma.
O indivíduo camuflado, escondendo a si mesmo, é transformado na imagem fabricada, no avatar* escolhido. Essa clandestinidade - contato com o escuso - é o previsível que despista, engana e passa a existir como promessa e compromisso.
Relacionamentos que se mantêm dentro de parâmetros estáticos, que não se dinamizam, que não estabelecem intimidade, significando, apenas, enquanto referências situacionais, funcionam como avatares. Alguns "relacionamentos afetivos", depois de alguns anos, podem ser representativos de tédio, manutenção e obrigação. Famílias que se mantêm valorizando obrigações, compromissos, regras e deveres, são, com o passar do tempo, esvaziadas, encobertas por ícones: o pai, a mãe, os mais velhos que precisam ser cuidados e, também, a ideia de que deve ser retribuído o recebido. A vivência de gratidão/ingratidão é uma maneira de desvitalizar os relacionamentos. As retribuições são tão nefastas quanto as desconsiderações, desde que normatizam regras e acertos e, assim, não há espontaneidade.
O familiar é o íntimo, não é o que apoia, o que ajuda e é ajudado. Família pode ser transformada em avatar mesmo quando significativa de amor, gratidão, ressentimento, mágoa e frustração.
O próximo é o distante, o distante é o próximo. Distância não existe quando há integração. O íntimo, o familiar, sempre é o outro que tem cara, luz e cor; não é aparência, nuances, texturas estampadas em suas coberturas e máscaras.
Avatares estão atuando não só no mundo virtual, mas em toda parte, sempre que se age através de aparências construídas.
Avatares estão atuando não só no mundo virtual, mas em toda parte, sempre que se age através de aparências construídas.
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* Avatar é uma palavra que vem do sânscrito 'avatara'; literalmente significa "descida" e se refere à manifestação ou aparição da divindade. No hinduísmo a palavra está mais associada à mitologia de Vishnu com seus inúmeros avatares ou encarnações. A partir dos anos 80, o nome avatar foi muito usado em um jogo de computador e desde então passou a ser comum tanto na mídia, quanto em informática, referindo-se a personagens criados por um usuário nas redes de relacionamento ou outros ambientes virtuais.
- "Costumes em Comum" de E.P.Thompson
- "O Último da Tribo" de Monte Reel
verafelicidade@gmail.com
Vera,
ResponderExcluirMaravilha de texto!!!É muito esclarecedor,ler de forma tão clara e objetiva, sentimentos e atitudes já vividos por mim.Obrigada por mais este presente.bjos Ana Cristina
Obrigada Ana. Valeu seu insight.
ExcluirBeijos,
Vera