Paradoxos da neurose
É conhecida a escalada paradoxal da hipocondria: viver faz mal, causa doença. Este implícito funciona como uma espada de Dâmocles, é condutora e mantenedora do comportamento paradoxal. Não ir até o fim, negar, desconhecer e subtrair implicações, permite sobreviver, gera divisões, paralelas que nunca se encontram, que não estabelecem conflito embora sejam paradoxais. A não globalização fragmenta, pontualiza e ao firmar posicionamentos, nega toda possibilidade de dinâmica, de diálogo.
Várias situações no viver neurótico, distorcido - na não aceitação - criam atitudes paradoxais.
Cuidar dos sintomas, evitá-los, estabelece um caudal ritualístico, maneiras de com eles conviver ao ponto de criar vícios, hábitos. É frequente o viciado em síndrome de pânico. Enfileirar queixas, estabelecer reivindicações, fazer com que familiares e acompanhantes participem dos cuidados necessários para evitar o pânico é um vício que desloca tensão, consequentemente alivia. Detestar a solidão, demandar relacionamentos mais íntimos, mais intensos e quando eles surgem, evitá-los por desconfiança e medo, é também paradoxal.
As divisões vivenciadas posicionadamente impedem correlação, constatação e categorização. Nestes casos, é muito difícil perceber que o que apoia, oprime ou que a mão que alimenta é a mesma que explora. A mãe que todo dia reza para ver sua filha protegida dos desejos eróticos e cobiçosos do pai, seu marido, é a mesma que faz de conta que não viu o que viu, que nega o que enxergou ocorrendo. Paralelas estabelecem obliquidades disfarçadas que distorcem o existente, tanto quanto geram espaço ocupado pela ansiedade e desespero pela aparente impossibilidade de soluções.
Ter pânico, para algumas pessoas, é a maneira de saber-se vivo e cuidado, tanto quanto é também uma maneira sutil e carente de dizer não, de dizer sim, de recusar o enfrentamento, a decisão e a ação - é o álibi. A continuidade deste processo vicia, aplaca, é o caminho conhecido onde o despropósito prazeiroso impera.
- "Tempos Fraturados" de Eric Hobsbawn
- "Junky" de William S. Burroughs
verafelicidade@gmail.com
Para cada frase eu seria capaz de indicar uma pessoa do meu círculo e convivência, que se encaixa perfeitamente dentro daquele modelo. Mas sabe qual deveria ser a nossa preocupação como forma de exercício? Colocar ali o nosso nome. Certamente com mais ou menos gravidade temos nossas neuras. Ou como costumo brincar: Traumas? quem não "temos"?. Valeu o desafio da leitura. rs
ResponderExcluirA pessoa sabe do problema que tem e foge do enfrentamento, é mto mais confortável, seja a fuga através das crises de pânico, através da orações. É tudo negação que gera a doença .
ResponderExcluirPertinentes suas observações, Raquel. Abraço. Vera
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