Caixa-preta - cogitações

Toda situação não globalizada cria linhas de fuga e de aproximação para que se possa perceber suas implicações; é a necessidade de perspectiva que se coloca. São invasões contextualizadas que, buscando ampliar as malhas do entendimento criam pontos cegos, pontos obscuros responsáveis por dicotomização, por divisão. Instalada a quebra da situação surgem necessidades de avaliação, de confrontos para estabelecer garantia de categorização, garantia de decisão.

Conflitos, divisões e indecisões decorrem do que não é globalizado, do que não é percebido em sua totalidade. No contexto da ignorância, da não apreensão das variáveis configuradoras dos fenômenos, os valores, intuições, garantias e comparações costumam significar e passam a ser orientadores do que se precisa decidir para agir. São situações onde o popular “se não sabe o que fazer, não faça nada” não funciona, pois não fazer nada, não agir é uma atitude, uma decisão. Sacrifícios e heroismos são nutridos nestas situações de conflito, indecisão e dúvida. Urgência e necessidade, frequentemente obrigam a desconsiderar aspectos que, se percebidos, exilariam dúvidas e conflitos. Por exemplo, procurar distribuir duzentos quilos com uma alavanca que só permite deslocamento de cento e oitenta quilos gera desastre. Por outro lado, é também neste contexto que surgem aprimoramentos tecnológicos, que se desenvolve métodos, ferramentas capazes de atingir X sem destruir Y à medida que são configuradas e globalizadas as variáveis estruturantes dos fenômenos.

Inadequação, fracassos cotidianos e afetivos são causados por cogitações que apenas consideram resultados ou necessidades. Aplacar medo, conseguir garantir a segurança nas crises, nas dificuldades, às vezes nas enfermidades, só é possível quando são percebidas as variáveis configuradoras do que ocorre. Quanto mais existentes são os ângulos redutores e prolongados do configurado, mais fácil a possibilidade de distorção, de não globalização, de viés. Na vida cotidiana, o questionamento do que ocorre traz sempre dinamização. Nas posturas sociais, quanto mais interesses e partidarismos, menos possibilidade de diálogo. E na ciência e tecnologia são fundamentais os índices, os limites definidos criadores de especificidade e de esclarecimentos sobre propriedades e impropriedades de utilização de certas substâncias: sabemos que não basta ser líquido, incolor e sem cheiro para poder ser bebido como água, tanto quanto não tranquiliza verificar que certas plataformas podem suportar pesos segundo suas especificações de carga, precisa ser verificado se ela tem pontos de ferrugem que impedem suportar qualquer carga. A ignorância, a redução de variáveis à plots, a conjuntos mensuráveis, cria ilusões responsáveis por falhas, fracassos e frustrações.

Saber que sabe, conhecer que conhece permite abranger as configurações e assim exilar cogitações em torno das questões, em torno do que ocorre. Desespero, medo, dúvida, insegurança são sempre resultantes de parcializações vivenciais, comuns no autorreferenciamento, na ignorância e nas vivências de imitação e repetição. Neste sentido, os protocolos, os detalhamentos de procedimentos para exercício de tarefas, muito esclarecem e iluminam, mas também obscurecem.

É frequente as cogitações se relacionarem com crenças, superstições, preconceitos e clichês que servem para elaborar decisões, substituindo o percebido aqui e agora por um antes ou depois desfigurador, quase um fantasma, uma bruma do existente, transformando-o magicamente. Este processo cria avaliação onde tudo conflui para correr ou correr risco.



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