Elogio
Nossa época é avara em elogios pois é pródiga em autorreferenciamento.
Perceber o outro, reconhecer suas boas atitudes, seus limites e disponibilidade requer não estar autorreferenciado, centrado nos próprios propósitos, metas e desejos. Para estar com o outro é necessário não se contextualizar no próprio campo de referências de metas e desejos, pois nesse contexto, quando o outro é percebido e faz algo passível de elogio, geralmente esse instantâneo elogio não se realiza pois é capturado pela inveja e pelo ciúme de quem o observa.
Para elogiar é preciso ficar diante do outro, admirando o feito, sem interesses dilapidadores. O mais simples e comum, o elogio, o reconhecimento, se transforma em imensa dificuldade, pois estabelece rinhas de concorrência e competição, responsáveis pelo isolamento.
O elogio é um ato de justiça e é também encontro, tanto quanto é transcendência dos próprios limites. Muito importante no processo de socialização, é por meio do elogio que se estrutura reconhecimento. Nas famílias, nos relacionamentos em geral, elogios foram transformados em moedas de transação para consecução de objetivos próprios. Na sociedade são propostas situações nas quais o elogio é uma regra. Essa burocratização cria doença, loucura, insensatez, desde que gera despersonalização: constantes elogios à criança prodígio, ao filho maravilhoso ou ao amante incrível, por exemplo. O discurso para o paraninfo, os grandes elogios às autoridades são exageros do que podemos chamar de reconhecimentos obrigatórios, na expectativa de retribuição com suas consequentes ladainhas.
Elogiar é reconhecer o outro, só possível quando se sai de si mesmo, do autorreferenciamento. Do contrário é apenas uma manifestação de objetivos e interesses próprios e manipuladores.
Elogiar é ser justo, é não tirar do outro, por meio da inveja e ciúme, o que dele é.
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