O hábito aliena



Repetir é esvaziar os processos que questionam, que perguntam. A continuidade das respostas faz com que se repita. Os acertos e congruências realizam objetivos. Não é necessário se deter, não é necessário perceber o que ocorre, basta manter, repetir.

Vidas assim processadas, transformadas em clichês, são referências cujos significados são determinados pelo consenso geral. São os posicionamentos engolidores das dinâmicas relacionais. Afirmações como: “isso precisa ser feito, é a regra, tudo vai depender dessas ações” equivale à criação de padrões e modelos determinantes de ajustes, de acerto e também de alienação.

Acordar com a surpresa de que a luz voltou, o dia nasceu de novo é o espanto, às vezes certeza, mas sempre a ideia de que o novo se inaugura. O repetido familiariza, não cria estranheza e o que é familiar é suave, é tranquilo, mas também é anestesiante, passa a esconder tudo que é diferente, que é novo. A mudança desbarata, estabelece busca de controle, mas é também o que possibilita movimentação.

Habituar-se é andar sozinho, é seguir a linha, é a tranquilidade da homeostase, do cuidar orgânico, do sobreviver como ápice de realização. Satisfeitos e felizes, ficamos muito próximos da alienação quando isso é conseguido pela manutenção de hábitos e certezas inquestionáveis.

Satisfação e felicidade, quando resultam de questionamento, mudança e reestruturação autônoma desses hábitos e certezas, inquietam e é assim que “caminha a humanidade”, é assim que os usos e costumes das gerações, das famílias, sociedades e instituições são transformados.

Os hábitos esclerosam, alienam e impedem questionamentos, impedem a percepção do novo, tanto quanto do que está sempre e nunca do nosso lado - aquilo que nos organiza e protege.



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