Problemáticas humanas - questões estruturantes VI
Ter autonomia é ser gerido, regulado e orientado pelos próprios referenciais de sustentação. Essa é a base relacional, processual que permite vivenciar o que acontece enquanto esclarecimento. É o diálogo com o que se dá, com o que ocorre e que delineia direção e motivação. A globalização desse processo implica na manutenção da unidade individualizada, fazendo com que não se vivencie o que ocorre em função de referenciais passados ou perspectivas futuras. Estar contido, limitado ao presente é estar sendo esgotado e situado no que acontece. Essa totalização de demandas, de configurações, unifica, pois o vivenciado é açambarcado enquanto possibilidades realizadoras e superadoras da própria vivência. Não se fragmenta em circunstâncias, não se divide em conflitos. Fundamentalmente essa vivência impede a trituração que fragmenta, dispersa e faz ancorar, estacionar nas circunstâncias que aplacam necessidades. Estar coeso, inteiro é o contexto no qual se estrutura autonomia. Exercendo a constante distinção entre aderência e imanência, e ainda o saber que está enfrentando e seguindo o próprio processo, as próprias motivações, evita atalhos. Cortar caminhos é uma maneira de adquirir novos critérios, polarizar eventos, perseguindo soluções. Essa atitude descentraliza, faz se perder nas circunstâncias, nos próprios desejos, pois as motivações foram circunstancializadas. É exatamente aí que inúmeras forças são somadas. São utilizados apêndices, ajudantes e boas circunstâncias para que os propósitos, desejos e motivações se realizem. Perde-se autonomia com essa circunstancialização, que também é responsável por gerar insegurança, ansiedade e expectativa. É o ir além das próprias condições buscando os melhores resultados que impede autonomia, pois ela implica em se manter dentro dos próprios limites, das próprias incapacidades e capacidades. Perder autonomia gera oportunismo - capacidade de transformar incapacidades usando outras pessoas e/ou situações -, gera subordinação e submissão escoadas em atitudes onipotentes, pois a onipotência é uma maneira de esconder impotência. Aceitação dos próprios limites é a única maneira de transformá-los. Esse processo é constante, e quando não realizado passa a ser preenchido por metas, sonhos, necessidades de apoio e ajuda. Assim surgem medo, ansiedade, angustia, não aceitação de si, dos outros, do mundo, expressas nas clássicas queixas: "que vida insuportável", "mundo cão!", "ninguém me ajuda", "bastaria uma ajuda para iniciar tudo certo". É a neurose, perdeu-se autonomia.
Autonomia é a chave da transformação que possibilita perceber a contradição em relação ao que conflitua e esmaga. É o grande enigma, o Graal a ser encontrado. Autonomia é o que começa a pavimentar disponibilidade, caminho para ser aceito pelo outro e por si mesmo, removendo sintomas, embaraços, inadequações. O ser humano se percebe como infinita possibilidade de relacionamento, e assim transcende suas contingências, mostrando-se como ponto de partida, como ponto de encontro de processos relacionais, estabelecendo situações. É a descoberta do estar-no-mundo-com-o-outro, consigo mesmo, é a transformação diante dos obstáculos gerados pelos desejos, pelos propósitos e metas de vencer, de conhecer, de conseguir. É a humanização, a personalização enquanto individualidade e desse modo os andaimes da causalidade, efetividade e poder são abandonados. Viver é tão simples e fácil quanto respirar, dormir ou andar, quando essas funções básicas e vitais não são subtraídas pelas doenças, guerras, fome e danos ambientais.
Bom dia, Sra. Vera Felicidade!
ResponderExcluirEstamos em busca desta autonomia, desta chave da transformação (ou transmutação - no contexto espiritual?). Mas, ainda é difícil fazer deste caminho o meu. Porém, continuamos perseverando.
Namastĕ
Prezado Ronaldo, só pelas constatações e questionamentos das não aceitações, metas e desejos delas provenientes, é que a autonomia é estruturada. Autonomia não se encontra nem se busca, resulta de um processo psicológico. Namastê.
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