Engenhosidade
A capacidade de tentar superar obstáculos criando apoios é exemplar como característica humana capaz de contornar e vencer dificuldades. Da descoberta do fogo, passando por colheres e panelas e chegando às naves espaciais, do enfrentamento de intempéries à adaptação e superação de doenças, a vida humana se caracteriza por criar e inovar. As mudanças biológicas, tecnológicas e sociais são uma resposta às
dificuldades que foram enfrentadas e consequentemente mudadas. A neurose, o oportunismo, o uso e abuso do outro também se inserem nesse delineamento. Esse uso do outro - neurose, coisificação - é sempre construção, artefato, substituição, bengala para suprir deficiências, medos, incapacidades. Por exemplo, o desejo sexual por crianças - a pedofilia - geralmente resulta da tentativa de driblar a impotência, a dificuldade e medo diante do outro. Da mesma forma, a exploração do trabalho alheio, mais-valia e plágios intelectuais e profissionais, atestam a engenhosidade e também o autorreferenciamento. Canibalizar, em seu sentido mais amplo se alimentar do outro, é devastador enquanto possibilidade de exercer humanidade. Hoje em dia, aparentemente mais leves, mas igualmente destruidores, os plágios e as fake news são "iscas" para conseguir o que se quer, são desumanizadores e sonegam caminhos e perspectivas de mudança. Quando a continuidade, a engenhosidade se transforma em catapulta de ganância e avidez, ela apenas escamoteia crueldade e consequente desumanização. O ser humano se desumaniza ao buscar exceção e regimes de exceção para realizar-se como capaz e poderoso. Fazer tudo confluir para os próprios interesses, para superar as próprias deficiências, é danoso para o outro, que é transformado em matéria prima para realização de anseios de conquista e riqueza. Para o vendedor de caixões e sepulturas, quanto mais gente morra, mais seu negócio cresce. Como, então, vender sepulturas e não querer mais e mais mortes? - Isso é possível quando o sentido, a necessidade de sepultar não é negócio, é função, é resultante de processos, escoadouro de sistemas. Esses limites configuradores devem ser bem claros, para que inversões, distorções não surjam. Engenhos mortíferos são aniquiladores da sociedade, basta pensar na indústria de armas, de medicamentos, de entretenimento. Industrializar soluções é sempre questionável; os problemas é que deveriam estar em foco, na mira dos engenhos, e não o que os soluciona.
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