Propósitos não unificados

 


 

A falta de objetividade gera indecisão. E por que não existe objetividade? Por haver divisão. Querer uma situação, tanto quanto querer a outra antagônica ou diversa só pode ser resolvido quando desejo e propósito são unificados. É unificação do aqui e agora, vivenciando o antes como o criador do depois, e subordinando o agora às resultantes do que o caracteriza e cria divisões. O que está aí, o que está aqui e agora comigo, está aqui e agora comigo, entretanto essa obviedade situacional é percebida como fragmentada. Critérios de vantagens e desvantagens, de dúvidas, destroem a evidência, fazendo com que o que está diante de mim não se transforme em resultado, em crença, em índice indicativo de outros processos. É a dúvida, o medo, a vivência de estar sendo perseguido que passa a se constituir em contextos a partir dos quais tudo é percebido. Não se sabe o que se faz, pois não se sabe o que vai acontecer. Esse medo/desejo é destruidor do que está acontecendo, seu significado foi extrapolado. O perceber e deduzir que tudo é etapa, que tudo são degraus para convergência ou divergência do que se quer, é o que acontece quando a vivência do presente, do que está acontecendo, é realizada por meio de metas, de desejos. Essa vivência apaga o presente, nega o que está acontecendo. Vivências de melancolia, tédio, depressão decorrem desse tipo de atitude. Nada é explícito, tudo tem outro significado, no mínimo não basta o que acontece, se pensa que é preciso decidir, descobrir o que está encoberto, descobrir o que vai ser solucionado, evitando cair no problematizado. Essa transformação do que acontece em enigma, em charada, cria medo, depressão. É ver o mundo, o outro como porta-voz, como índice. Essa desnaturalização, despersonalização, desvitalização do existente faz com que se exista sozinho, nada é diferente, nada é verdade. Não se pode caminhar em pisos frágeis, tábuas que escondem buracos, abismos. O medo, a decepção, a negação do outro, da sua presença, negam o presente. Às vezes a negação do outro é exercida como forma de fugir dos medos e agressões exercidas pelo mesmo. Essa atitude de negação cria realidade de “paz e amor” que inexiste, e assim, quando a realidade surge o indivíduo sucumbe. Não é raro ouvirmos: “meu marido me bate, mas não é ele, é uma entidade que o persegue, se eu colocar um amuleto, uma folha de arruda, tudo vai ser bom”, e após sofrer violência, ela explica: “estava sem o amuleto, por isso ele me bateu”. A não aceitação do que ocorre gera comportamentos e explicações desprovidas de nexo, de coerência, de lógica, e também negam os problemas, desde que os mesmos não são enfrentados. Se deter no que acontece é uma maneira de enfrentar, mudar e também continuar vivências. É uma maneira de estar no mundo aceitando limites e as possibilidades de transformá-los.

 

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