Intranquilidade


Intranquilidade é a dificuldade de se deter no que se propõe, é também o determinante de ansiedade, carência e medo.

Não conseguir se concentrar no que é vivenciado, a incapacidade de ser absorvido pelo presente gera ansiedade, gera medo; é uma falta que estabelece reinvindicação desejo e carência.

A intranquilidade se constitui em dínamo, propulsão ao comportamento. Vive-se para realizar, para conseguir, para demonstrar que pode, consolidando-se assim a impossibilidade de se deter, ou seja, a não vivência do presente. Acontece que o presente existe e demanda presença, tem que se por os pés no chão. As drogas miraculosas são pára-quedas, artefatos que possibilitam as aterrissagens: o mundo desmorona, os próprios desejos são fantasmas, mas se consegue ficar calmo, aparentar bem-estar. 

Em situações de intimidade, em situações limites onde a presença é necessária, os artefatos são dinamitados. A impotência, a incapacidade de lidar com os limites, expressa as artimanhas e máscaras escamoteadoras. Não se sabe quem é, não se sente nada, apenas se flutua sobre o que ocorre.

Esta impossibilidade de presença, de participação e envolvimento denuncia e aniquila todos os álibis mantidos. É a crise, sempre adiada, que agora se impõe.
















- "O Diário de Nijinsky" de Vaslav Nijinsky
- "Filósofos na Tormenta" de Elizabeth Roudinesco

Comentários

  1. Vera,
    Um vídeo que, para mim, ilustra bem este artigo: o crescendo da intranquilidade, o limite explícito no palco redondo, a crise inevitável, dinamitada ao final.

    http://www.youtube.com/watch?v=DvS6vSlanEw.

    Adorei o artigo e a menção a Nijinsky.
    Beijos,
    Milena

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    1. Perfeito Milena, a coreografia expressa bem este movimento que você apreendeu.

      Beijos,
      Vera

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  2. Legal Vera.

    Esse texto me remeteu muito ao Yogasutra, em sua definição do que é Yoga, do que acontece em “estado de Yoga“, e também das aflições (klesas), e dos padrões de percepção (vrtti-s) que nascem deles.
    Além disso, venho refletindo muito a respeito de como uma prática de asana e de pranayama podem tanto auxiliar uma pessoa e ser mais livre, como também também podem alienar ainda mais essa mesma pessoa, gerando, no fim das contas, ainda mais intranquilidade.
    O que tu acha disso?

    abraço!

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    1. Oi Diego, obrigada pelo comentário, mas é o que eu falei "Intranquilidade é a dificuldade de se deter no que se propõe, é também o determinante de ansiedade, carência e medo." Tranquilidade é condição para a concentração do yoga, é sempre uma resultante da não ansiedade. Infelizmente, nas estruturas de não aceitação, de neurose, tudo é buscado como solução: do yoga às terapias, ao relacionamento afetivo, etc. Sinceridade, dedicacão, "pureza de propositos" como dizem os bons professores de yoga está cada vez mais embaralhado com necessidades de vencer, impressionar, ganhar dinheiro. Tudo isto gera ansiedade, base da instabilidade, da intranquilidade.

      Abraço

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