Experiência

Uma idéia compartilhada por inúmeras pessoas é a de que a experiência traz serenidade, discernimento e acerto.

Nem sempre “a voz do povo é a voz de Deus” como se pensa ou poucas vezes a maioria expressa e distingue as tessituras que estruturam o comportamento.

Experiência é acúmulo de vivências formadoras de matrizes; se por um lado isto fala dos processos que permitem conhecimento, discernimento, por outro lado, isto explica a força do a priori, a força dos preconceitos. O encaixe dos acontecimentos no lastro, no tabuleiro do vivenciado é o criador de padrões e regras, como sempre, defasadas em relação ao que está ocorrendo. Adquirir experiência, geralmente, é acúmulo na vivência autorreferenciada. O autorreferenciamento, que contém e reserva estas vivências, é responsável por parcializações e dogmas. Amealha-se experiência e, assim, começa-se a conhecer, entender e perceber tudo que ocorre. O antes se torna significante para entender o agora e preparar-se para o depois.

Experientes são dogmáticos, ressabiados, precavidos e aptos a resolver o que acontece. Este respaldo da vivência - a experiência - cria divisórias insignificantes para conter e explicar o novo, o que ocorre no presente e assim se constrói a luta diária entre pais e filhos, entre experientes e iniciantes. A experiência como aprendizagem é um processo repetitivo que tranquiliza, gera acerto, mas boicota o inesperado, o criativo.

Amplidão de possibilidades, entendimento e conhecimento, só existem, quando resultam de disponibilidade, de perceber o que ocorre enquanto está ocorrendo; isto não é experiência, é relacionamento resultante da apreensão do que está acontecendo, é o insight, a constatação do percebido com suas direções configuradoras.

O bom de hoje, não necessariamente será o bom de amanhã, tanto quanto não o foi o de ontem. Valores preenchem demandas e necessidades, porém não significam enquanto disponibilidade, embora até permitam tolerância e compreensão. Experientes são tolerantes/intolerantes, compreensivos/incompreensivos; conhecem atalhos e simplificam, parcializando fenômenos.

Ser experiente é ter acúmulo de vivências, histórias que são sempre defasadas e obsoletas quando a elas se recorre. A experiência é apenas um arquivo útil/inútil. Catalogação e referencias mapeiam a vivência do experiente e isto é uma sobreposição aos acontecimentos quando usada como ponto de partida para entendimento do que ocorre. Os movimentos de convergência gerados pela experiência, sinalizam autorreferenciamento danoso para os relacionamentos, para a percepção do presente.

Muitas vezes a disponibilidade é destruída ao se satisfazer com o bem-estar proporcionado pela convivência com pessoas experientes, que tudo resolvem e sabem dentro de seus adequados e confortáveis referenciais, frequentemente neutralizadores de ansiedade e medo, mas também, neutralizadores da continuidade, da possibilidade de mudança e novidade.

Quando a experiência se torna o contexto através do qual conflitos e discordâncias são resolvidas, tudo é amortecido, neutralizado por situações alheias ao que ocorre - surgem acordos, dependências e valorização do aderente considerado necessário e útil. Valorizar a experiência, seja de homem, seja de mulher, de profissional ou amigo, é uma maneira de transformá-los em objetos úteis e necessários.

A experiência, quando transcendida, deixa de ser um posicionamento sempre gerador de conhecimento autorreferenciado. Ao questionar o que se percebe, ao questionar as experiências que suportam e mantém repertórios de comportamento, vitaliza-se certezas e dúvidas. A experiência questionada é o que permite disponibilidade.

O importante é estar sem divisões e dedicado ao que se faz; esta é a verdadeira experiência que permite mudanças.














 
 
- “A Desmedida na Medida” de Albert Camus
- “Entre Quatro Paredes - Huis-Clos” de Jean Paul Sartre



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