Jogo de ilusões - ilusões dando certezas e apegos




Real é o percebido, real é o aparente, consequentemente toda realidade é ilusão quando percebida em função de a priori, de metas e desejos. Só podemos entender realidade e ilusão como resultantes da percepção, da reversibilidade contextual que lhes dá significado.

Identificar ilusão e realidade é uma aspiração constante. São conceitos que se misturam seja nas manipulações religiosas, nas licenças poéticas ou na neurose.

Jorge Luis Borges dizia que "facilmente aceitamos a realidade, talvez por intuirmos que nada é real".

As ilusões são implicitamente o amparo do real enquanto fundo que suporta o percebido. As implicações, as decorrências caracterizam a ilusão, o não percebido. Nesse sentido, a frase de Borges ganha dimensões mais abrangentes e válidas à medida que, deixando de ser apenas um jogo de palavras, passa a explicitar a vivência do real e sua aceitação.

Baseando-me nas relações de figura-fundo nas leis perceptivas que atestam que o fundo é o estruturante, nunca percebido, afirmo que real é o aparente, que real é o percebido e ilusão é o que não é percebido. Ilusão é o fundo e realidade é a figura, é o percebido. Em outras palavras, crenças, certezas, preconceitos, enfim, a priori geralmente é o referencial (o fundo) de nossas percepções. Por isso, quanto mais certezas, menos disponibilidade e mais rigidez. É paradoxal afirmar que crenças são fontes de engano e ilusão, mas o que explica esse paradoxo é estar posicionado em situações anteriormente vivenciadas. Ter certeza é agarrar-se ao categorizado, é posicionar-se em uma convicção que sustenta a certeza, se constituindo em fundo cuja figura é o apego (à certeza).

E como percebemos que nos iludimos? Pela reversibilidade perceptiva, o que é figura torna-se fundo, o que é fundo torna-se figura, ou seja, no desenrolar da vida novas situações tornam pregnante, tornam perceptível a situação limitadora (agora figura) e é nesse momento que vivenciamos o engano, que nos sentimos iludidos, que esbarramos na realidade.

Tudo que é percebido é real, é a figura, enquanto o que não se percebe é o fundo; assim, as ilusões só são percebidas quando deixam de ser fundo estruturante (a priori, certezas, metas, desejos), passando a ser figura.

Real é a vivência do presente, consequentemente sua constatação. 



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