Perdido em função das circunstâncias

 




Quando o indivíduo se define e situa pelo que o apoia, sustenta, anima e satisfaz, ele se contingencia. Estar em função das circunstâncias, variando segundo flutuações obriga a ter barcos, bússolas e outros instrumentos para estabilizar o percurso. Não se bastar, estar definido pela família, pelo dinheiro, pelas instituições religiosas, acadêmicas e outras que o abrigam e molduram é sempre despersonalizador. Não se sabe como viver sem ajuda financeira da família, não sabe como abrir mão do caudal de benesses conseguidas via universidades, organizações partidárias, comissões de cargos vitalícios etc. A dependência é uma constante na vida desses guardiões de vantagens e conveniências. Pensões sempre transferidas, cargos que se perpetuam, "golpes de baú", benefícios conferidos pela instrumentalização da beleza, ou da inteligência criadora de diferenciais, mesmo que engolidos por sistemas comercializadores, tudo isso é sempre valorizado quando há apego ao que propicia as conveniências e adaptações.

Estar apegado ao outro, aos filhos, aos pais, aos amores - ao grande amor por exemplo - é também uma distorção. O outro foi transformado em objeto, bengala, porto seguro, jardim do paraíso, lugar exitoso onde os pomos dourados são colhidos. A utilização do outro para o próprio bem estar, prazer e satisfação de necessidades é alienadora, pois o outro foi transformado em objeto, local, situação a partir da qual tudo é resolvido. Ao ser transformado em instrumento útil necessário, maravilhoso e imperdível, o outro é adulterado em sua essência. Uma série de compromissos, regras, submissões passam a existir e assim esse transbordamento afoga o indivíduo. Vive-se por e para, e esta condição é básica para negar o presente, o instante, a vida. O apego está mais ligado ao que é morto do que ao que é vivo, apegar-se é agarrar, segurar, estrangular. O apego à própria vida é uma não aceitação da mesma, pois tem seu corolário: a morte.

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